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ESTRESSE - 1a. Parte Geraldo J. Ballone Introdução Nas últimas décadas, a expressiva mudança em todos os níveis da sociedade passou a exigir do ser humano uma grande capacidade de adaptação física, mental e social. Muitas vezes, a grande exigência imposta às pessoas pelas mudanças da vida moderna e, conseqüentemente, a necessidade imperiosa de ajustar-se à tais mudanças, acabaram por expor as pessoas à uma freqüente situação de conflito, ansiedade, angústia e desestabilização emocional. O estresse patológico surge como uma conseqüência direta dos persistentes esforços adaptativos da pessoa à sua situação existencial. Seria impossível e, ao mesmo tempo, extremamente indesejável eliminar completamente todos os tipos de estresses. Fisiologicamente, a ausência total de estresse equivale à morte. O que devemos tentar fazer é reduzir, nas pessoas, os efeitos danosos do estresse que sociedade proporciona e sensibilizá-las para os meios capazes ajudar a administrar melhor os estressores do cotidiano. Devemos buscar uma postura onde o estresse seja um acontecimento positivo e não um empecilho ao desempenho pessoal, à saúde e à felicidade. O ideal seria adquirirmos habilidades para melhorar física e mentalmente nossa resistência ao estresse, bem como eliminar o estresse desnecessário. Atitudes assim baseiam-se na modificação de alguns aspectos no estilo de vida nas atitudes. Aproximadamente 50 a 75% de todas as consultas médicas estão direta ou indiretamente relacionadas ao estresse. A medicina não deve ter apenas um papel importante no tratamento das doenças ligadas ao estresse mas, também e principalmente, deve dar ao assunto uma conotação preventiva e educacional. Conhecer o estresse, suas causas, sinais e sintomas, é de fundamental importância para aprendermos a lidar com ele. Procurando significados para a palavra estresse (stress, em inglês), vamos entender que estar estressado significa "estar sob pressão" ou "estar sob a ação de estímulo persistente". Na realidade, estar estressado não significa apenas estar em contacto com algum estímulo mas, sobretudo, significa um conjunto de alterações acontecidas num organismo em respostas à um determinado estímulo capaz de colocá-lo sob tensão. Sem esse tal "conjunto de alterações" não se pode falar em estresse. Em decorrência desse entendimento, podemos ainda chamar de Estímulo Estressor ou Agente Estressor, qualquer estímulo capaz de provocar num organismo, esse complexo conjunto de respostas orgânicas, mentais, psicológicas e/ou comportamentais definidas como estresse. Entretanto, longe de considerarmos o estresse uma armadilha da natureza, esse conjunto de alterações fisiológicas tem como principal objetivo adaptar o indivíduo à situação proporcionada pelo estímulo estressor. O estado de estresse está, então, intimamente relacionado com a capacidade de adaptação do indivíduo à circunstância atual. Há quem compare (erradamente) o estresse com o susto, entretanto, aproveitando as semelhanças entre as alterações fisiológicas que acontecem durante um susto com aquelas do estresse, podemos dizer que o estresse seria, como que, um estado de susto crônico e continuado. Há ainda quem confunda o estresse com a ansiedade. Na realidade e quando muito, a ansiedade pode ser considerada um dos componentes psíquicos do estresse, juntamente com o medo, pânico, apreensão, angústia, desespero, etc. O estresse envolve o organismo como um todo e, assim como o aumento de adrenalina e cortisona possam ser considerados componentes endócrinos do estresse, a ansiedade seria, igualmente, um dos componentes psíquicos. O estresse não implica, obrigatoriamente, numa alteração patológica e doentia. Ele contribui para a adaptação e, sem nenhuma dúvida, ele tem boa parcela de responsabilidade na sobrevivência das espécies, incluindo a nossa. Imagine um gato permanecendo totalmente apático ao aparecer-lhe um cachorro. Sua sobrevivência estaria seriamente comprometida. Da mesma forma, imaginemos um ser humano enfrentando uma tempestade com a mesma lassidão que experimenta depois de uma lauta refeição. No esporte, no trabalho ou na vida social o estresse "normal" deve desempenhar uma função adaptativa e, sobretudo, sadia. O estresse produz uma vasta série de modificações na composição química e na estrutura funcional do organismo. Algumas dessas modificações são necessárias à adaptação do indivíduo à situação atual, podem até ser mecanismos de defesa contra os agentes estressores, entretanto, algumas vezes, tais modificações podem resultar em dano ou lesão. Nesse caso, ao invés de contribuírem para a adaptação
farão exatamente o contrário. A própria classificação internacional das doenças (CID.10), agrupa num mesmo capítulo as Reações Agudas ao Estresse Grave e os Transtornos do Ajustamento (adaptação), sugerindo fortemente que uma pode levar ao outro. Na década de 30, o pesquisador canadense Hans Selye, quem estudou pela primeira vez e profundamente essa questão, denominou o conjunto das modificações orgânicas resultantes do contacto do organismo com um determinado estímulo desencadeador de tensão de Sindrome Geral de Adaptação (SGA).
O que é o Estresse O estresse é a alteração global de nosso organismo para adaptar-se à uma situação nova ou às mudanças de um modo geral. O estresse é um mecanismo normal, necessário e benéfico ao organismo, pois faz com que o ser humano fique mais atento e sensível diante de situações de perigo ou de dificuldade. Mesmo situações consideradas positivas e benéficas, como é o caso por exemplo das promoções profissionais, casamentos desejados, nascimento de filhos, etc., podem produzir estresse. Do ponto de vista pessoal, mudanças ocorrem em nossas vidas continuamente e temos sempre de estar nos adaptando à elas. Nesses casos o estresse funciona como um mecanismo de sobrevivência e adaptação, necessário para estimular o organismo e melhorar sua atuação diante de circunstâncias novas. Do ponto de vista social e cultural as mudanças cotidianas, em si, não são novidade na civilização humana, elas são, na realidade, a base da evolução de nossa espécie. O que, talvez, seja novo ao ser humano e perigoso à sua saúde, é a velocidade sem precedentes com a qual essas mudanças e as exigências que elas propiciam acontecem na vida moderna. Essas mudança estão em toda a parte; mudanças importantes na tecnologia, na ciência, medicina, ambiente de trabalho, nas estruturas organizacionais, nos valores e costumes sociais, na filosofia e mesmo na religião. Há continuamente uma enorme solicitação de adaptação às pessoas em geral, tanto para os jovens como para os mais velhos. Como é o Estresse Em tese, estresse é a resposta fisiológica, psicológica e comportamental de um indivíduo que procura se adaptar e se ajustar às pressões internas e/ou externas. Essas pressões, capazes de levar ao estresse, são chamadas de Fatores Estressantes ou Agentes Estressores. Assim sendo, Fator Estressor é um acontecimento, uma situação, uma pessoa ou um objeto capaz de proporcionar suficiente tensão emocional, portanto, capaz de induzir à reação de estresse. Os fatores estressantes podem variar amplamente quanto à sua natureza, abrangendo desde componentes emocionais, como por exemplo a frustração, ansiedade, até componentes de origem ambiental, biológica e física, como é o caso do ruído excessivo, da poluição, variações extremas de temperatura, problemas de nutrição, sobrecarga de trabalho, etc. Quando nosso cérebro, independentemente de nossa vontade, interpreta alguma situação como ameaçadora (Fator Estressante), nosso organismo passa a desenvolver uma série de alterações denominadas, em seu conjunto, de Síndrome Geral da Adaptação ao Estresse. Na primeira etapa dessa situação ocorre uma Reação de Alarme, onde todas as respostas corporais entram em estado de prontidão geral ou seja, todo organismo é mobilizado sem envolvimento específico ou exclusivo de algum órgão em particular. É um estado de alerta geral, tal como se fosse um susto. Se esse estresse continua por um período mais longo sobrevém a Segunda fase, chamada de Fase de Resistência, a qual acontece quando a tensão se acumula. Nesta fase o corpo começa a acostumar-se aos estímulos causadores do estresse e entra num estado de Resistência ou de Adaptação. Durante este estágio, o organismo adapta suas reações e seu metabolismo para suportar o estresse por um período de tempo. Neste estado a reação de estresse pode ser canalizada para um órgão específico ou para um determinado sistema, seja o sistema cardiológico, por exemplo, ou a pele, sistema muscular, aparelho digestivo, etc. Entretanto, a energia dirigida para adaptação da pessoa à solicitação estressante não é ilimitada e se o estresse ainda continuar, o corpo todo pode entrar na terceira fase, o Estado de Esgotamento, onde haverá queda acentuada de nossa capacidade adaptativa.
Fisiologia da Síndrome Geral de Adaptação A Síndrome Geral de Adaptação descrita por Selye consiste, como vimos, em três fases sucessivas: Reação de Alarme, Fase de Resistência e Fase de Exaustão. Sendo que a última, Fase de Exaustão, é atingida apenas nas situações mais graves e, normalmente, persistentes. Vejamos uma a uma. Reação de Alarme A Reação de Alarme subdivide-se em dois estados, a fase de choque e a fase de contra-choque. As alterações fisiológicas na fase de choque, momento onde o indivíduo experimenta a ameaça ou estímulo adverso (estressor), são muito exuberantes (Quadro 1). Durante a Reação de Alarme, participa ativamente do conjunto das alterações fisiológicas o chamado Sistema Nervos Autônomo (SNA). Trata-se, este SNA, de um complexo conjunto neurológico que controla, autonomamente, todo o meio interno do organismo, através da ativação e inibição dos diversos sistemas, vísceras e glândulas. ALTERAÇÕES INICIADAS NA FASE DE CHOQUE DA REAÇÃO DE ALARME ALTERAÇÕES OBJETIVOS a) aumento da frequência cardíaca e pressão arterial o sangue circulando mais rápido melhora a atividade muscular esquelética e cerebral, facilitando a ação e o movimento b) contração do baço levar mais glóbulos vermelhos à corrente sanguínea e melhora a oxigenação do organismo e de áreas estratégicas c) o fígado libera glicose para ser utilizado como alimento e energia para os músculos e cérebro d) redistribuição sanguínea diminui o sangue dirigido à pele e vísceras, aumentando para músculos e cérebro e) aumento da frequência respiratória e dilatação dos brônquios favorece a captação de mais oxigênio f) dilatação das pupilas para aumentar a eficiência visual g) aumento do número de linfócitos na corrente sanguínea preparar os tecidos para possíveis danos por agentes externos agressores Durante a Fase de Choque predomina a atuação de uma parte deste SNA chamado de Sistema Simpático, o qual proporciona descargas de adrenalina da medula da glândula supra-renal e de noradrenalina das fibras pós-ganglionares para a corrente sanguínea. Alguns estudos mais recentes sugerem que a emo ção da raiva, quando dirigida para fora, estava associada mais à secreção de noradrenalina. Entretanto, na depressão e a na ansiedade, onde os sentimentos estão dirigidos mais para si próprio, a secreção de adrenalina predomina. Ainda durante o momento em que está havendo estimulação estressante aguda (Fase de Choque da Reação de Alarme), uma parte do Sistema Nervoso Central denominado Hipotálamo promove a liberação de um hormônio, o qual, por sua vez, estimula a hipófise (glândula vizinha ao Hipotálamo) a liberar um outro hormônio, o ACTH, este ganhando a corrente sanguínea e estimulando as glândulas Supra-renais para a secreção de corticóides. Como percebemos, toda a seqüência de acontecimentos tem origem no cérebro, e o Hipotálamo é que acaba disparando a sucessão de eventos. Ao mesmo tempo em que esse Hipotálamo está providenciando a estimulação da Hipófise para secreção do ACTH, também proporciona a secreção outros neurohormônios (hormônios produzidos no cérebro), tais como os chamados peptídeos cerebrais, como é o caso das endorfinas (que modificam o limiar para dor), STH (que acelera o metabolismo), prolactina e outros. Desaparecendo os agentes estressores, todas essas alterações tendem a se interromper e regredir. Se, no entanto, por alguma razão o organismo continuadamente submetido à estimulação estressante, portanto, é obrigado a manter seu esforço de adaptação, uma nova fase acontecerá. Trata-se da Fase de Resistência. Fase de Resistência A Fase de Resistência se caracteriza, basicamente, pela hiperatividade da glândula supra-renal sob influência do Diencéfalo, Hipotálamo e Hipófise. Nesta fase, mais crônica, há um aumento no volume da supra-renal, concomitante a uma atrofia do baço e das estruturas linfáticas e um continuado aumento dos glóbulos brancos do sangue (leucocitose.
Se os estímulos estressores continuam, tornando-se crônicos e repetitivos, a resposta começa a diminuir de intensidade e pode haver uma antecipação das respostas. É como se a pessoa começasse a se acostumar com os estressores mas, não obstante, pudesse também desenvolver a reação diante apenas da perspectiva ou expectativa do estímulo. Vamos imaginar, hipoteticamente, uma pessoa que se deparasse com uma cobra no meio de sua sala, quase todas as vezes que entrasse em casa. Com o tempo sua reação ao ver a (mesma) cobra tende a diminuir, embora ainda continue tomando muito cuidado. Vai chegar um momento em que, mesmo não vendo a cobra, nessa vez que chegou em casa, ficará estressado. Talvez tenha grande ansiedade ao imaginar onde poderia estar hoje a tal cobra. Diz um ditado que a diferença entre medo e ansiedade é exatamente essa; medo é encontrar uma cobra dentro do quarto, e ansiedade é saber que tem uma cobra dentro do quarto. Continuando ainda o agente estressor o organismo vai à terceira fase da SGA, a Fase de Exaustão. Fase de Exaustão É quando começam a falhar os mecanismos de adaptação e déficit das reservas de energia. Essa fase é grave, levando à morte de alguns organismos. A maioria dos sintomas somáticos e psicossomáticos ficam mais exuberantes nessa fase. Como se supõe, a resistência do organismo não é ilimitada. O estado de Resistência é a soma das reações gerais não específicas que se desenvolvem como resultado da exposição prolongada aos agentes estressores, frente aos quais desenvolveu-se adaptação e que, posteriormente, o organismo não pode mantê-la. As modificações biológicas que aparecem nessa fase se assemelham aquelas da Reação de Alarme, mais precisamente às da fase de choque. Mas, nesta fase o organismo já não é capaz de equilibrar-se por si só e sobrevém a falência adaptativa. Desadaptação e Esgotamento Através das alterações fisiológicas observadas durante a Reação de Alarme (Choque e Contra-Choque), o ser humano e os animais superiores foram dotados de um complexo mecanismo fisiológico à disposição da adaptação, mecanismo esse capaz de promover transformações diante de circunstâncias ameaçadoras, e não apenas alterando o desempenho físico e visceral do organismo mas, sobretudo, fornecendo uma quantidade suficiente de ansiedade como requisito psicológico para a manutenção desse estado de alerta, para viabilizar melhores possibilidades de ataque ou de fuga. Enfim, esta Síndrome Geral de Adaptação viabiliza no ser humano as atitudes adaptativas necessárias para a manutenção da vida diante de um mundo dinâmico e altamente solicitante. Curiosamente, diante desta maravilhosa característica adaptativa que proporciona a Síndrome Geral de Adaptação, intriga-nos o fato de tão brilhante mecanismo defensivo se relacionar com o desenvolvimento de transtornos emocionais, físicos e psicossomáticos? Talvez o ser humano, dito civilizado, tenha começado a padecer com a Síndrome Geral de Adaptação quando seus objetivos, inicialmente colocados à disposição de sua sobrevivência física, foram deslocados para a sua sobrevivência social e afetiva. Os agentes estressores que continuamente estão a estimular a pessoa não são mais apenas ameaças ao seu bem estar físico e imediato, são, antes disso, também estressores que estimulam uma tomada de atitude diante de ameaças subjetivas e abstratas. Talvez, em algum momento de nossa pré-história, o ser humano não necessitava mais apenas sobreviver, como talvez tenha sido a preocupação absoluta de nossos ancestrais da caverna, mas necessitava sobreviver socialmente, profissionalmente, familiarmente e economicamente. Não era mmais necessário adaptar-se apenas ao aqui e agora, como exigência momentânea de sua trajetória existencial mas, sobretudo, devia adaptar-se ao seu passado, ao seu presente e ao seu futuro. O aqui e agora é apenas uma parte do esforço adaptativo do ser humano e, mesmo assim, não se trata de uma atitude voltada exclusivamente para a manutenção prática de sua existência. Psicologicamente a adaptação é convocada para que o indivíduo exista desta ou daquela forma e não simplesmente para que exista. Além disso, o ser humano tem que adaptar-se emocionalmente às suas cicatrizes do passado e às suas perspectivas do futuro. O ser humano tem que adaptar-se aos problemas da infância, às perdas e abandonos sofridos, às agressões, ao medo e frustrações. Tem que adaptar-se às expectativas que seu grupo social lhe dirige, à uma identidade conveniente mas nem sempre sincera, adaptar-se à competição e à manutenção de seu espaço social, às angústias do amor, à conquista da segurança para seus entes queridos, enfim, tem que
adaptar-se às ameaças impalpáveis e abstratas, ameaças essas encontradas mais em seu próprio interior, como um inimigo sempre presente, do que fora dele. Tudo isso, ou seja, todos estes estímulos estressores, são capazes de convocar a Síndrome Geral de Adaptação por tempo indeterminado. As reações de estresse resultam do esforço adaptativo. As doenças, bem como o leigamente conhecido "esgotamento", surgem quando o estímulo estressor for muito intenso ou muito persistente. É o custo (mental e biológico) do esforço adaptativo. Os efeitos da Síndrome Geral de Adaptação sobre o indivíduo cronicamente ao longo do tempo compõem o substrato fisiopatológico das doenças psicossomáticas. Cada órgão ou sistema é envolvido e apenado pelas alterações fisiológicas continuadas do estresse, de início apenas funcionalmente e depois, anatomicamente. Por causa disso, podemos dizer que as Doenças Psicossomáticas são aquelas determinadas ou agravadas por motivos emocionais, já que é sempre a emoção quem detecta a ameaça e o perigo, sejam eles reais, imaginários ou fantasiosos. Os efeitos da Síndrome Geral de Adaptação sobre o indivíduo cronicamente ao longo do tempo compõem o substrato fisiopatológico das doenças psicossomáticas. Cada órgão ou sistema é envolvido e apenado pelas alterações fisiológicas continuadas do estresse, de início apenas funcionalmente e depois, anatomicamente. Por causa disso, podemos dizer que as Doenças Psicossomáticas são aquelas determinadas ou agravadas por motivos emocionais, já que é sempre a emoção quem detecta a ameaça e o perigo, sejam eles reais, imaginários ou fantasiosos.
Tipos de Estressores Conforme já comentamos, a ansiedade e o estresse não são monopólios do ser humano. Se colocarmos um gato junto de um cão feroz num espaço fechado, depois de algum tempo o gato estará esgotado; primeiro ele terá muita ansiedade, entrará em estresse e, pela continuidade do estímulo agressivo (presença do cão), acabará se esgotando. Tendo em vista o fato do gato representar uma ameaça menos agressiva para o cão do que o cão representa para ele, o cão ficará esgotado depois do gato. Nesse caso o cão representa para o gato um estímulo agressivo externo, por estar fora do gato e, inato, por fazer parte da natureza biológica de todos os gatos. Assim sendo, nos animais os estímulos para o desenlace da ansiedade podem ter duas naturezas e uma só origem: quanto à natureza eles podem ser inatos, como vimos, do tipo gato tem medo de cachorro ou, por outro lado, podem ser condicionados por treinamento e experiência. Quanto à origem serão sempre externos, partindo do pressuposto que os animais não têm condições para alimentar um conflitos intrapsíquicos. No ser humano dito civilizado esses estímulos costumam ter, ao contrário dos animais, duas origens; podem ser externos e, principalmente, internos. Os estímulos internos são oriundos dos conflitos pessoais os quais, em última instância, refletem sempre a sensibilidade afetiva de cada um. Os estímulos externos, por sua vez, representam as ameaças concretas do cotidiano de cada um. Como se suspeita, no ser humano modernos os estímulos adquiridos e internos são aqueles que maior papel desempenham no desencadeamento e manutenção do estresse. As ameaças normalmente são interiores, abstratas, continuamente presentes e freqüentemente invencíveis. Podemos dizer também, que a possibilidade de ficar doente seja uma ameaça séria, um estímulo ameaçador importante. É claro que é. Entretanto, podemos experimentar uma grande ansiedade devido ao fato de pensarmos que podemos ficar doentes ou, ao contrário, se essa idéia não vier sempre à nossa consciência, não experimentaremos ansiedade com isso. Esse estímulo estressor é interno e não externo. Seria um estímulo externo caso houvesse, de fato, sinais de que nossa saúde está abalada. Enquanto houver apenas o medo de passar mal, de poder ficar doente, isso será uma ameaça interna. Ora, enquanto nos animais os estímulos agressivos externos aparecem periodicamente, no ser humano a presença dos estímulos internos pode ser continuada. Havendo pois, uma afetividade problemática, insegurança e/ou pessimismo, vamos sentir ameaças internas continuamente. Nessas circunstâncias podemos ter o esgotamento por persistência do agente estressor. É por causa desses estímulos internos contínuos que a ansiedade humana tem sido constante, exagerada e às vezes patológica. As ameaças externas, pelo contrário, não costumam ser constantes. Vejamos o caso das ameaças concretas acerca de nossa segurança pessoal, por exemplo: a ameaça de sermos assaltados,
agredidos, mortos, etc. A possibilidade até existe, nos grandes centros, mas não é contínua. Há situações onde podemos nos sentir seguros, racionalmente falando. Entretanto, o estímulo interno não é tão racional quanto o é emocional. Isso quer dizer que podemos estar ansiosos devido ao medo de sermos assaltados e agredidos, embora essa possibilidade seja mínima na prática. Além disso, podemos nos deparar com o medo do desemprego, da derrota competitiva, da falta de segurança social e econômica, ou qualquer outra coisa que não se encontra palpável no tempo ou no espaço (como é o assaltante). Nós vamos dormir e acordamos com as ameaças internas. Finalizando, devemos entender que os estímulos necessários para determinar a ansiedade são proveniente de duas origens: são externos quando se devem à sucessão de acontecimentos de nossa vida aos quais temos que nos adaptar e serão internos quando se originam dentro de nós mesmo s, de nossos medos, nossos pensamentos negativos, nossas inseguranças. Força de Estressores Vários autores tentaram estabelecer alguma espécie de graduação de importância para os vários estímulos estressores possíveis no cotidiano. Embora algumas listas possam dar a idéia de grau ou da força variável dos estressores, como por exemplo, separação conjugal seria mais estressante que mudança de emprego e menos do que a morte do filho, essas tabelas perdem o valor quando consideramos que as pessoas são muito diferentes quanto à sua forma de reagir aos desafios impostos pela vida. Algumas pessoas podem superar perfeitamente alguma perda importante, enquanto outros podem desenvolver um transtorno emocional como resposta à acontecimentos estressantes de menor importância. As variáveis pessoais desempenham um papel decisivo na maneira de reagor aos eventos de vida. De um modo geral, pelo menos é bom termos em mente que existem categorias de estressores que nos impõem grandes esforços adaptativos, como por exemplo, a morte de um ente querido, uma grande perda, severos revezes econômicos, constatação de doença séria, etc., e, ao lado desses, existem os pequenos acontecimentos estressantes do cotidiano que acontecem com maior frequência na vida das pessoas e, finalmente, existem ainda a influência dos conflitos íntimos pessoais. Mas, além dos acontecimentos eventualmente considerados estressantes, para o desencadeamento e manutenção do estresse há imperiosa necessidade de uma vulnerabilidade pessoal à ansiedade. Vulnerabilidade pessoal é uma espécie de tendência constitucional a reagir mais ansiosamente aos estímulos. Algumas pessoas reagem com uma ativação fisiológica maior aos acontecimentos estressantes. Um exemplo médico que pode se prestar à analogia com o estresse seria, novamente, o da reação alérgica. Se, dentro de um mesmo ambiente impregnado de bolor, existirem 10 pessoas e 3 delas reagirem com espirros, coriza e lacrimejamento como sinal de uma rinite alérgica ao mofo, não se pode, medicamente falando, alegar a rinite diretamente ao fungo do bolor. Se assim fosse todos os demais também teriam essa reação. Para ocorrer a reação alérgica é indispensável existir o mofo mais a sensibilidade pessoal.
Aspecto Pessoal dos Estressores Nossa capacidade de conhecer o mundo decorre de nossa percepção pessoal da realidade. Essa percepção pessoal da realidade, diferente em cada um de nós, é chamada de procepção da realidade. O principal conhecimento que devemos ter disso, é que a realidade será sempre representada intimamente e de acordo com os filtros afetivos de cada um, ou seja, de acordo com a sensibilidade (afetiva) de cada um. A percepção pessoal da realidade engloba toda a realidade ou toda nossa maneira de ver e sentir o mundo e só à essa realidade (única para nós) nos reportaremos. Engloba não apenas a concepção que temos das coisas que estão fora da gente, como também os conceitos que cultivamos dentro da gente. Isso inclui também a imagem que nós temos de nós mesmos, ou seja, inclui nossa própria auto-estima. Essa auto-estima, por exemplo, poderá ser representada mais negativamente ou mais positivamente, de acordo com a tonalidade afetiva de cada um. Algumas pessoas se vêem ótimos, outras se vêem péssimos. Assim sendo, a idéia que temos de nós mesmos pode, por si só, ser um estímulo agressivo e causador de ansiedade, caso a idéia de nós seja uma idéia ruim e que nos perturba constantemente. Mesmo em se tratando de um eventual estímulo externo, proveniente do mundo objetivo e concreto, sua natureza agressiva poderá ser mais traumática ou menos traumática, ou seja, mais estressante ou menos estressante, dependendo da conotação mais agressiva ou menos agressiva à ele atribuída por nossa sensibilidade (afetiva). Ter que falar em público, por exemplo, pode representar uma ameaça maior ou
menor, dependendo das circunstâncias pessoais de cada um; da segurança, auto-estima, preocupação exagerada com os outros, etc.
Ansiedade, Estresse e Esgotamento Ansiedade, Estresse e Esgotamento são termos de uso corrente entre as pessoas participantes daquilo que se chama vida moderna. Ninguém gosta de pensar na Ansiedade, no Estresse, no Esgotamento ou na Depressão como formas de algum transtorno emocional, é claro. Isso pode parecer muito próximo do descontrole, da piração ou da loucura e, diante da possibilidade de sermos afetados, pelo menos alguma vez na vida, pelo Estresse, pelo Esgotamento ou pela Depressão, então será melhor não considerá-los como formas de algum transtorno emocional. Devemos considerar o Estresse uma ocorrência fisiológica e normal no reino animal. O Estresse é a atitude biológica necessária para a adaptação do organismo à uma nova situação. Em medicina entende-se o Estresse como uma ocorrência fisiológica global, tanto do ponto de vista físico quanto do ponto de vista emocional. As primeiras pesquisas médicas sobre o Estresse estudaram toda uma constelação de alterações orgânicas produzidas no organismo diante de uma situação de agressão. Fisicamente o Estresse aparece quando o organismo é submetido à uma nova situação, como uma cirurgia ou uma infecção, por exemplo, ou, do ponto de vista psicoemocional, quando há uma situação percebida como de ameaça. De qualquer forma, trata-se de um organismo submetido à uma situação nova (física ou psíquica), pela qual ele terá de lutar e adaptar-se, conseqüentemente, terá de superar. Portanto, o Estresse é um mecanismo indispensável para a manutenção da adaptação à vida, indispensável pois, à sobrevivência. Do ponto de vista psíquico o Estresse se traduz na Ansiedade. A Ansiedade é, assim, uma atitude fisiológica (normal) responsável pela adaptação do organismo às situações de perigo. Vejamos, por exemplo, as mudanças acontecidas em nossa performance física quando um cachorro feroz tenta nos atacar, quando fugimos de um incêndio, quando passamos apuros no trânsito, quando tentam nos agredir e assim por diante. De frente para o perigo nossa performance física faz coisas extraordinárias, coisas que normalmente não seríamos capazes de fazer em situações mais calmas. Se não existisse esse mecanismo que nos coloca em posição de alerta ou alarme, talvez nossa espécie nem teria sobrevivido às adversidades encontradas pelos nossos ancestrais. Embora a Ansiedade favoreça a performance e a adaptação, ela o faz somente até certo ponto, até que nosso organismo atinja um máximo de eficiência. À partir de um ponto excedente a Ansiedade, ao invés de contribuir para a adaptação, concorrerá exatamente para o contrário, ou seja, para a falência da capacidade adaptativa. Nesse ponto crítico, onde a Ansiedade foi tanta que já não favorece a adaptação, ocorre o esgotamento da capacidade adaptativa. Vejamos ao lado, a ilustração de um gráfico hipotético, onde teríamos um aumento da adaptação proporcional ao aumento da Ansiedade até um ponto máximo, com plena capacidade adaptativa. A partir desse ponto o desempenho ou adaptação cai vertiginosamente. Aí se caracteriza o Esgotamento. Em nossos ancestrais esse mecanismo foi destinado à sobrevivência diante dos perigos concretos e próprios da luta pela vida, como foi o caso das ameaças de animais ferozes, das guerras tribais, das intempéries climáticas, da busca pelo alimento, da luta pelo espaço geográfico, etc. No ser humano moderno, apesar dessas ameaças concretas não mais existirem em sua plenitude tal como existiram outrora, esse equipamento biológico continuou existindo. Apesar dos perigos primitivos e concretos não existirem mais com a mesma freqüência, persistiu em nossa natureza a capacidade de reagirmos ansiosamente diante das ameaças. Com a civilidade do ser humano outros perigos apareceram e ocuparam o lugar daqueles que estressavam nossos ancestrais arqueológicos. Hoje em dia tememos a competitividade social, a segurança social, a competência profissional, a sobrevivência econômica, as perspectivas futuras e mais uma infinidade de ameaças abstratas e reais, enfim, tudo isso passou a ter o mesmo significado de ameaça e de perigo que as questões de pura sobrevivência à vida animal ameaçavam nossos ancestrais. Se na antigüidade tais ameaças eram concretas e a pessoa tinha um determinado objeto real à combater (fugir ou atacar), localizável no tempo e no espaço, hoje em dia esse objeto de perigo vive dentro de nós. As ameaças vivem, dormem e acordam conosco.
Se, em épocas primitivas o coração palpitava, a respiração ofegava e a pele transpirava diante de um animal feroz a nos atacar, se ficávamos estressados diante da invasão de uma tribo inimiga, hoje em dia nosso coração bate mais forte diante do desemprego, dos preços altos, das dificuldades para educação dos filhos, das perspectivas de um futuro sombrio, dos muitos compromissos econômicos cotidianos e assim por diante. Como se vê, hoje nossa Ansiedade é continuada e crônica. Se a adrenalina antes aumentava só de vez em quando, hoje ela está aumentada quase diariamente. A Ansiedade aparece em nossa vida como um sentimento de apreensão, uma sensação de que algo está para acontecer, ela representa um contínuo estado de alerta e uma constante pressa em terminar as coisas que ainda nem começamos. Desse jeito nosso domingo têm uma apreensão de segunda-feira e a pessoa antes de dormir já pensa em tudo que terá de fazer quando o dia amanhecer. É a corrida para não deixar nada para trás, além de nossos concorrentes. É um estado de alarme contínuo e uma prontidão para o que der e vier. As férias são tranqüilas e festivas apenas nos primeiros dias mas, logo em seguida, começamos a nos agitar: ou porque sentimos que não estamos fazendo alguma coisa que deveríamos fazer, embora não saibamos bem o que, ou porque pensamos em tudo aquilo que teremos de fazer quando as férias terminarem. A natureza foi generosa oferecendo-nos a atitude da Ansiedade ou Estresse, no sentido de favorecer sempre a adaptação. Porém, não havendo período suficiente para a recuperação desse esforço psíquico, o qual restabeleceria a saúde, ou persistindo continuadamente os estímulos de ameaça que desencadeiam a reação de Estresse, nossos recursos para a adaptação acabam por esgotar-se. O Esgotamento é, como diz o próprio nome, um estado onde nossas reservas de recursos para a adaptação se acabam. Organicamente, no Esgotamento, há alterações significativas nas glândulas supra-renais (produtoras de de adrenalina e cortisona), há dificuldades no controle da pressão arterial, há alterações do ritmo cardíaco, alterações no sistema imunológico, no controle dos níveis de glicose do sangue, entre muitas outras. Psiquicamente a Ansiedade crônica ou Esgotamento leva à um estado de apatia, desinteresse, desânimo e de pessimismo em relação à vida. Os sintomas mais comuns da ansiedade podem ser listados como abaixo e, normalmente costumam estar relacionados à estresse ambiental crônico, têm um curso flutuante, variável e tendência à cronificação. SINTOMAS ASSOCIADOS À ANSIEDADE CRÔNICA · · · · · · · · · · · · · · · · · ·
01 - tremores ou sensação de fraqueza 02 - tensão ou dor muscular 03 - inquietação 04 - fadiga fácil 05 - falta de ar ou sensação de fôlego curto 06 - palpitações 07 - sudorese, mãos frias e úmidas 08 - boca seca 09 - vertigens e tonturas 10 - náuseas e diarréia 11 - rubor ou calafrios 12 - polaciuria (aumento de número de urinadas) 13 - bolo na garganta 14 - impaciência 15 - resposta exagerada à surpresa 16 - dificuldade de concentração ou memória prejudicada 17 - dificuldade em conciliar e manter o sono 18 - irritabilidade
O Esgotamento tem origem em duas ocasiões: 1. - Primeiro, quando a situação à qual o indivíduo terá que adaptar-se (estímulo externo ou interno) exigir intensa participação emocional e persistir continuadamente. Nesse caso há um esgotamento por falência adaptativa devido aos esforços (emocionais) para superar uma situação persistente. Isso quer dizer que o estímulo para o estresse seria ameaçador tanto para a pessoa que à ele reage, quanto para outras pessoas submetidas ao mesmo estímulo. 2. - Em segundo lugar, quando a pessoa não dispõe de uma estabilidade emocional suficientemente adequada para adaptar-se à estímulos não tão traumáticos, objetivamente falando. Isso quer dizer que a
pessoa sucumbiria emocionalmente à situações não tão agressivas à outras pessoas colocados na mesma situação mas, não obstante, agressivas particularmente à ela. Digamos, então, que o esgotamento ou a ansiedade crônica e patológica poderia surgir diante de duas circunstâncias: decorrente daquilo que o mundo traz à pessoa (Agentes Ocasionais) ou, por outro lado, decorrente daquilo que a pessoa traz ao mundo (Disposições Pessoais). A primeira representada pelo destino da pessoa e a segunda pelo seu perfil afetivo. Não obstante, o destino poderá modelar determinadas formas de valorizar a realidade em grande número de pessoas.
Estímulos que Produzem Ansiedade Se hoje sabemos muito sobre o Estresse e a Ansiedade, tanto do ponto de vista comportamental quanto neuroquímico, pouco sabemos ainda sobre seu aspecto principal ou primordial. Pouco sabemos sobre esse tal estímulo desencadeador ou estressor. É por aí onde tudo começa, ou seja, todas as reações orgânicas, as atitudes, emoções, comportamentos, alterações químicas fisiológicas, etc e tal, começam sempre à partir do tal estímulo. Conforme já comentamos, a Ansiedade e o Estresse não são monopólio do ser humano. Se colocarmos um gato junto de um cão num espaço fechado, depois de algum tempo esse gato estará Esgotado; primeiro ele terá muita Ansiedade, entrará em Estresse e, pela continuidade do estímulo agressivo (presença do cão) se esgotará. Tendo em vista o fato do gato representar para o cão uma ameaça menos agressiva que o cão representa para o gato, o cão ficará esgotado depois do gato. Nesse caso o cão representa para o gato um estímulo agressivo: externo, por estar fora do gato e, inato, por fazer parte da natureza biológica de todos os gatos. Assim sendo, nos animais os estímulos para desencadear-se a Ansiedade também podem ter duas origens: quanto à natureza eles podem ser inatos, como vimos, do tipo gato tem medo de cachorro ou, de outra forma, condicionados por treinamento e experiência. Quanto à origem serão internos, caso se trate de instintos e externos, quando for o caso do treinamento ou condicionamento (veja Quadro). No ser humano dito civilizado, esses estímulos também costumam ter duas origens; podem ser externos e internos. Os estímulos internos são oriundos dos conflitos íntimos. Os estímulos externos, por sua vez, representam as ameaças concretas do cotidiano de cada um. Nossa capacidade de conhecer o mundo proporciona uma percepção pessoal da realidade. Essa percepção pessoal da realidade, diferente em cada um de nós, é chamada de procepção da realidade. A principal idéia que devemos ter disso é que a realidade será sempre representada intimamente e de acordo com a personalidade de cada um. Essa percepção pessoal da realidade engloba toda nossa maneira de ver e sentir o mundo. Engloba não apenas a concepção que temos das coisas que estão fora da gente, como é o mundo objectual, como também os conceitos que temos dentro de nós. Isso inclui a imagem que temos de nós mesmos, ou seja, inclui nossa própria auto-estima. Nossa auto-estima pode ser representada favoravelmente ou não, de acordo com a tonalidade afetiva de cada um. Algumas pessoas se vêem ótimos, outras se vêem péssimos. Assim sendo, a idéia que nós temos de nós mesmos pode ser um estímulo agressivo e causador de Ansiedade, caso seja uma idéia a nos perturbar constantemente. É por causa desses estímulos internos que a Ansiedade humana tem sido constante e às vezes patológica. As ameaças externas não costumam ser tão constantes quanto as internas. Vejamos o caso das ameaças concretas acerca de nossa segurança pessoal, por exemplo: a ameaça de ser assaltados, agredidos, morto, etc. Possibilidades até existem, nos grandes centros, mas normalmente não é continuada. Há situações onde podemos nos sentir seguros, racionalmente falando. Por outro lado, o estímulo interno não é racional, é emocional. Isso quer dizer que podemos estar ansiosos devido ao medo de sermos assaltados, agredidos, humilhados, demitidos, etc., embora tais possibilidades sejam mínimas na prática. Da mesma forma, podemos dizer que ficar doente seja uma ameaça séria, um estímulo ameaçador importante. É claro que é. Entretanto, podemos experimentar uma grande Ansiedade devido ao fato de pensarmos que podemos ficar doentes. Esse estímulo já é interno e não externo. Seria externo caso houvesse, de fato, sinais de que nossa saúde foi abalada. Enquanto houver apenas o medo de passar mal, de poder ficar doente, isso será uma ameaça interna. Ora, enquanto nos animais os estímulos agressivos externos aparecem periodicamente, no ser humano a presença dos estímulos internos pode ser continuada. Havendo uma afetividade problemática, insegurança
e pessimismo, vamos sentir ameaças internas continuadamente. Vamos dormir com essas ameaças e acordar com elas. Portanto, nessas circunstâncias podemos ter o Esgotamento. Psicologicamente, para o ser humano a agressão depende mais do agente agredido que do agente agressor. Isso quer dizer que o estímulo para desencadear a Ansiedade depende, no mais das vezes, mais da sensibilidade da pessoa do que do estímulo propriamente dito. Para uma pessoa claustrofóbica, estar num elevador não significa simplesmente estar objetivamente num elevador. Será a Personalidade de cada um quem, de fato, atribuirá valores e significados aos acontecimentos, tomando-os ou não por estressantes, angustiantes, temerosos, ameaçadores e assim por diante. Um Ego funcionando adequadamente é capaz de prover a adaptação necessária entre o mundo externo e interno, ou entre o indivíduo e seu ambiente, ou, finalmente, entre o ser e seu destino. Sempre que houver fragilidade desse Ego, haverá comprometimento na adaptação e desequilíbrio entre o ser e o mundo ou, resumindo, haverá uma Ansiedade crônica. Como vimos acima, os estímulos capazes de proporcionar a Ansiedade podem ser ext ernos, denominados geralmente de circunstanciais e interpessoais, representados pelo embate entre as forças opressoras do ambiente e as condições da pessoa. Mesmo em se tratando de estímulos externos, provenientes do mundo objetivo, sua natureza agressiva poderá ser mais traumática ou menos traumática, dependendo da conotação à ele atribuída por nossa pessoa. Os estímulos podem ainda ser internos, denominados intrapsíquicos, onde se situam os Conflitos pessoais da pessoa normal ou os transtornos afetivos e traços ansiosos de personalidade nas pessoas mais problemáticas. A existência dos conflitos pode ser considerada fisiológica na espécie humana, ou seja, eles existem em todos nós e parecem ser essenciais ao desenvolvimento da Ansiedade. Em nosso cotidiano, sem termos plena consciência, experimentamos um sem-número de pequenos Conflitos, interpessoais ou intrapsíquicos; as tensões entre ir e não ir, fazer e não fazer, querer e não poder, dever e não querer, querer, poder e não dever, a assim por diante. Finalmente, devemos entender que os estímulos necessários para determinar a Ansiedade são proveniente de duas origens: são externos, quando se devem à sucessão de acontecimentos de nossa vida aos quais temos que nos adaptar e internos, quando se originam dentro de nós mesmos, de nossos medos, nossos pensamentos negativos, nossas inseguranças. No ser humano os estímulos produtores de Ansiedade costumam ser, predominantemente, de origem interna e pessoal, decorrentes da valoração individual que a pessoa atribui à sua realidade e aos fatos com os quais se depara. Sintomas da Ansiedade A Ansiedade pode se manifestar em três níveis: neuroendócrino, visceral e de consciência. O nível neuroendócrino diz respeito inicialmente à uma parte neurológica (eixo hipotálamo -hipofisário) e em seguida a alteração numa vasta constelação de manifestações bioquímicas e hormonais. Os efeitos mais evidentes da Ansiedade são aqueles provenientes da ação da adrenalina, noradrenalina, glucagon, hormônio anti-diurético e cortizona. No plano visceral a Ansiedade corre por conta do Sistema Nervoso Autônomo, o qual reage com predominância do sistema simpatico na reação de alarme ou, ao contrário, do sistema parassimpático (ou vagal) nas fase de esgotamento. Na consciência a Ansiedade pode se manifestar por dois sentimentos desagradáveis: 1- consciência das sensações fisiológicas e; 2- consciência de estar nervoso ou amedrontado. Os padrões individuais de Ansiedade excessiva variam amplamente. Alguns pacientes têm sintomas cardiovasculares, tais como palpitações, sudorese ou opressão no peito, alguns manifestam sintomas gastrointestinais como náuseas, vômito, diarréia ou vazio no estômago, outros têm mal-estar respiratório ou predomínio de tensão muscular exagerada, do tipo espasmo, torcicolo e lombalgia(9). Enfim, a sintomatologia orgânica e visceral varia de pessoa para pessoa. Sintomas Gerais do Estresse (Ansiedade Patológica) Quando as modificações fisiológicas necessárias à adaptação são eficientemente produzidas pela Ansiedade estamos diante da Ansiedade Normal. É o caso, por exemplo, das respostas diante de uma situação nova; o bebê que chora diante da fome deixando clara a vontade de comer, o adolescente em estado de alerta diante da prova do vestibular, o adulto muito atento ao trânsito. Por outro lado, falamos da Ansiedade Patológica, como uma forma de resposta inadequada, em intensidade e duração, à solicitações de adaptação; o bebê que chora ao ponto de perder o fôlego diante da fome, o adolescente em
estado de esquecimento total diante da prova do vestibular, o adulto hipertenso e com arritmia cardíaca no trânsito. Biologicamente a Ansiedade está relacionada à alguns sitemas neuroquímicos, chamados de sistema noradrenérgico, gabaérgico e serotoninérgico, situados no lombo frontal e no sistema límbico no Sistema Nervoso Central. As pessoas naturalmente ansiosas tendem a ter um tônus simpático aumentado, respondem emocionalmente de forma excessiva aos estímulos ambientais e demoram a adaptar-se às alterações do sistema nervoso autônomo. Segundo Kaplan, a Ansiedade tem uma ocorrência duas vezes maior no sexo feminino(9) e se estima que até 5% da população geral tenha algum tipo de Transtorno de Ansiedade. Sendo a Ansiedade uma grande mobilizadora do Sistema Nervoso Autônomo, nestes tipos de transtornos encontramos, sobretudo, uma rica sintomatologia física. Esta é uma razão mais que suficiente para que tais pacientes freqüentemente percorram um exaustivo itinerário médico. Sobre a sintomatologia geral da Ansiedade, comumente se observa pelo menos SEIS dos 18 sintomas seguintes: 01 - tremores ou sensação de fraqueza 02 - tensão ou dor muscular 03 - inquietação 04 - fadiga fácil 05 - falta de ar ou sensação de fôlego curto 06 - palpitações 07 - sudorese, mãos frias e úmidas 08 - boca seca 09 - vertigens e tonturas
10 - náuseas e diarréia 11 - rubor ou calafrios 12 - polaciuria 13 - bolo na garganta 14 - impaciência 15 - resposta exagerada à surpresa 16 - pouca concentração ou memória prejudicada 17 - dificuldade em conciliar e manter o sono 18 irritabilidade
Esses sintomas supra-listados são de natureza geral e inexpecífica, sujeitos a surgirem em todas as pessoas indistintamente. Trata-se de manifestações basicamente neuro-biológicas e consoantes ao desequilíbrio do Sistema Nervoso Autônomo, quase emancipados do componente emocional individual de cada um. Tal quadro costuma estar relacionados ao Estresse crônico, tem um curso flutuante (vão e vêem) e tendência à cronificação. Por outro lado, além das manifestações gerais e inexpecíficas da Ansiedade, podemos ter uma repercussão individual, pessoal e de acordo com as predisposições de personalidade. Aí surgem então os quadros e sintomas psíquicos da Ansiedade Patológica. Sintomas Psíquicos do Estresse (Ansiedade Patológica) É ampla a classificação dos transtornos emocionais decorrentes da Ansiedade Patológica, entretanto, reportaremos aqui apenas os quadros emocionais mais freqüentes e de maior importância clínica. Na Classificação Internacional de Doenças (CID.10) esses problemas aparecem no capítulo intitulado Transtornos Relacionados ao Estresse e Somatoformes. Aí estão incluídos a Síndrome do Pânico, os Transtornos Fóbicos, sendo atualmente o mais importante deles a Fobia Social e os Transtornos Somatoformes, ou seja, aqueles quadros onde há um componente físico principal decorrente de fatores emocionais. Tendo em vista o propósito absolutamente sintético desse trabalho, descreveremos resumidamente apenas alguns quadros do vasto capítulo dos Transtornos Relacionados ao Estresse e Somatoformes. Síndrome do Pânico A Doença ou Síndrome do Pânico é um quadro de Ansiedade Patológica caracterizado por crises ou ataques recorrentes de pânico e normalmente indicam a existência de motivos intrapsíquicos importantes geradores de grande Ansiedade. Os ataques de pânico se caracterizam por crises de medo agudo e intenso, extremo desconforto, sintomas vegetativos associados e grande preocupação sobre a possibilidade de morte iminente e/ou de passar mal, e/ou de perder o controle. Essas crises de ansiedade da Síndrome do Pânico duram minutos e costumam ser inesperadas, ou seja, não seguem situações especiais, podendo surpreender o paciente em ocasiões variadas. Não obstante, existem alguns pacientes que desenvolvem o episódio de pânico diante de determinadas situações préconhecidas, como por exemplo, dirigindo automóveis, diante de grande multidão, dentro de bancos, etc. Neste caso dizemos que o quadro é de Agorafobia com Transtorno do Pânico.
As classificações internacionais enfatizam que, muito freqüentemente, um Transtorno Depressivo coexiste com o Transtorno do Pânico. Nós, particularmente, achamos que a Síndrome do Pânico é, literalmente, uma forma atípica de doença depressiva. O sentimento de pânico é, em essência, uma grave sensação de insegurança e temor. Ora, quem mais, além dos deprimidos, podem sentir-se tão inseguros ao ponto de sentir a morte (ou o passar mal) iminente ? Depois do primeiro Ataque de Pânico, normalmente a pessoa experimenta importante ansiedade e medo de vir a apresentar um segundo episódio. É como se ficasse ansiosa diante da possibilidade de ficar ansiosa. Por causa disso os pacientes passam a evitar situações facilitadoras da crise, prejudicando-se socialmente e/ou ocupacionalmente em graus variados. São pessoas que deixam de dirigir, não entram em supermercados cheios, evitam aventurar-se pelas ruas desacompanhadas, não conseguem dormir, não entram em avião, não freqüentam shows, evitam edifícios altos, não utilizam elevadores e assim por diante. A Síndrome do Pânico habitualmente se inicia depois dos 20 anos de idade, é igualmente prevalente entre homens e mulheres quando desacompanhado da Agorafobia, mas é duplamente mais freqüente em mulheres quando associado à este estado fóbico. Segundo as principais classificações psiquiátricas, a característica essencial de um Ataque de Pânico é um período de intenso medo ou desconforto acompanhado por pelo menos 4 dos 13 sintomas somáticos ou cognitivos expostos na lista abaixo.
1- palpitações ou ritmo cardíaco acelerado 2- sudorese 3- tremores ou abalos 4- sensações de falta de ar ou sufocamento 5- sensações de asfixia 6- dor ou desconforto torácico 7- náusea ou desconforto abdominal
8- sensação de tontura, instabilidade, vertigem ou desmaio 9 -desrealização ou despersonalização (sentir-se outro) 10- medo de perder o controle ou enlouquecer 11- medo de morrer 12- parestesias (formigamentos) ou anestesia 13- calafrios ou ondas de calor
Os pacientes com Transtorno do Pânico podem necessitar estarem sempre acompanhados quando saem de casa e, posteriormente, podem até se recusar a sair de casa devido ao tamanho medo de passar mal na rua, de morrer subitamente ou enlouquecer de repente. Normalmente esses pacientes têm dificuldade em dormir desacompanhados, procuram insistentemente o cardiologista e recorrem ao auxílio religioso com entusiasmo exagerado. Os Ataques de Pânico não ocorrem somente no chamado Transtorno do Pânico típico. Eles podem ocorrer em uma variedade de Transtornos de Ansiedade, como por exemplo, na Fobia Social, na Fobia Específica, no Transtorno de Estresse Pós-Traumático e no Transtorno de Estresse Agudo. É por causa dessa não-especificidade dos sintomas de pânico que somos inclinados a julgá-lo mais como um sintoma (de depressão atípica) que como uma doença independente. Fobias Sociais As Fobias Sociais estão centradas em torno de um medo anormal e absurdo de expor-se a outras pessoas e tem, como conseqüência, o afastamento e evitamento sociais. Podem ser específicas às situações de comer ou falar em público mas podem ser mais difusas, envolvendo quase todas as circunstâncias sociais fora do ambiente familiar(13). Neste caso, entre as situações fóbicas que invariavelmente resultam na evitação do objeto, atividade ou situação socialmente temidos, destaca-se o medo de humilhação e embaraço em lugares públicos, o medo de comer em público, falar em público, urinar em banheiro público e, muito freqüentemente, de assinar cheques à vista de pessoas estranhas. A exp osição à situação social ou de desempenho provoca, quase que invariavelmente, uma resposta imediata de ansiedade, a qual pode assumir a forma de um Ataque de Pânico ligado à situação ou predisposto pela situação.
DIRETRIZES E CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO PARA TRANSTORNO FÓBICO SOCIAL 1- os sintomas psicológicos, comportamentais e autossômicos devem provir da ansiedade e não de outros quadros mentais; 2- a ansiedade deve ser restrita e/ou predominar à situações sociais; 3- a evitação das situações fóbicas deve ser proeminente; 4- o comportamento de evitação interfere nas atividades sociais ou no relacionamento interpessoal; 5- a pessoa reconhece que seu medo é irracional e excessivo. O prejuízo na atividade social de pessoas portadoras da Fobia Social pode chegar ao extremo do isolamento. Nas situações sociais ou de desempenho temidas, os indivíduos com Fobia Social experimentam preocupações acerca de embaraço e temem que outros os considerem ansiosos, débeis, "malucos" ou estúpidos. O medo de falar em público pode ser em virtude da preocupação de que os outros percebam o tremor em suas mãos ou voz. Podem ainda experimentar extrema ansiedade ao conversar com outras pessoas pelo medo não saberem se expressar. Os sintomas de ansiedade que surgem nessas situações costumam ser palpitações, tremores, sudorese, desconforto gastrintestinal, diarréia, tensão muscular, rubor facial, etc. Em crianças a Fobia Social pode se apresentar sob a forma de crises de choro, ataques de raiva, imobilidade, comportamento aderente ou permanência junto à mãe ou à uma pessoa familiar. Essa apatia social pode chegar ao ponto do mutismo total em certos casos de contacto com pessoas estranhas. Crianças pequenas podem mostrar-se excessivamente tímidas em contextos sociais, retraindo-se do contato, recusando-se a participar em brincadeiras de grupo, permanecendo tipicamente na periferia das atividades sociais e tentando permanecer próximas a adultos conhecidos. Transtorno Somatoforme Os pacientes com Transtorno Somatoforme em geral são poliqueixosos, com sintomas sugestivos de problemas funcionais de algum órgão ou sistema ou de alterações nas sensações corpóreas sobre a funcionalidade do organismo como um todo. Estas síndromes funcionais podem aparecer como quadros dolorosos incaracterísticos, transtornos cardiocirculatórios, ou qualquer outro órgão ou sistema, que não se confirmam por exames especializados. Nota-se sempre, inclusive com reconhecimento pelo próprio paciente, variação na intensidade das queixas conforme alterações emocionais, embora a maioria deles insista em discordar do ponto de vista médico que aponta para a possibilidade psíquica dos sintomas. O principal aspecto do Transtorno Somatoforme é a queixa repetida de sintomas físicos, juntamente com uma tendência persistente para investigações médicas, apesar dos seguidos resultados negativos nos exames de diagnóstico. Caso haja algum componente físico associado às queixas somáticas, aquele não explica as proporções destas. Na maioria das vezes estes pacientes manifestam u m comportamento histriônico (teatral e histérico), o que motivava a antiga classificação ter incluído tais transtornos no capítulo das histerias. Normalmente esses pacientes somatoformes estão recebendo atenção médica de mais de um profissional, envolvem mais de uma especialidade simultaneamente e a sintomatologia se apresenta de maneira dramática, vaga e exagerada. Os pacientes com queixas somáticas normalmente relatam uma história médica bastante extensa, têm facilidade para memorizar nomes de medicamentos e de doenças complicadas, conhecem quase tudo acerca de exames subsidiários e seus relatos costumam ser um tanto dramáticos. São quase incapazes de referir uma dor simplesmente como, por exemplo, uma pontada. Normalmente eles dizem que dói como se um ferro em brasa estivesse entrando, como uma punhalada, como se arrancassem seus órgãos, etc.
SINTOMAS DO TRANSTORNO DE SOMATIZAÇÃO 1 - vômitos
12 - dor durante o ato sexual
2 - palpitações 3 - dor abdominal 4 - dor torácica
13 - dor nas extremidades 14 - impotência 15 - dor lombar
5 - náuseas
16 - dismenorréia
6 - tonturas
17 - dor articular
7 - flatulência 8 - ardência nos órgãos genitais
18 - outras queixas menstruais 19 - dor miccional
9 - dia rréia
20 - vômitos durante a gravidez
10 - indiferença sexual
21 - dor inespecífica
11 - intolerância alimentar
22 - falta de ar
Para o diagnóstico do Transtorno Somatoforme é importante que os sintomas causem sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes. A representação subjetiva dos sintomas somatizados reflete sempre um aspecto sóciocultural do paciente. Em camadas menos diferenciadas da população notamos empobrecimento na representação dos sintomas, como por exemplo, a menstruação que sobe para a cabeça, o sangue sujo, uma dieta puerperal mal conduzida, a conseqüência desastrosa de olhar no espelho depois da refeição, uma mistura fatal de manga com leite, sustos capazes de provocar paralisias e assim por diante. Nos níveis mais diferenciados a representação da doença é melhor elaborada, como por exemplo, uma polineurite conseqüente à hipersensibilidade à algum medicamento. De qualquer modo, a manifestação emocional somatizada não respeita posição sócio-cultural, como podem suspeitar alguns, não guarda também relação com o nível intelectual, pois, como já vimos, a emoção é senhora e não serva da razão. O único fator capaz de atenuar as queixas é a capacidade da pessoa expressar melhor seus sentimentos verbalmente. Quanto maior a capacidade do indivíduo referir seu mal-estar através de discurso sobre suas emoções, como por exemplo, relatando sua angústia, sua frustração, depressão, falta de perspectiva, insegurança, negativismo, pessimismo e coisas assim, menor será a chance de representar tudo isso através de palpitações, pontadas, dores, falta de ar, etc. Sintomas do Esgotamento Diante do Esgotamento o organismo todo pode entrar em sofrimento. É como se esgotasse não apenas nossa capacidade de adaptação às mais diversas circustâncias de vida mas, sobretudo, a capacidade de nos adaptarmos à nós mesmos. Nesses casos de Esgotamento há acentuada perda no limiar de tolerância aos estímulos externos e acentuada inadequação ambiental. O quadro clínico emocional apresentado por uma pessoa com Esgotamento é o mesmo observado nos episódios depressivos. Entretanto, a Depressão pode aparecer sob duas formas; uma forma clássica, melhor conhecida por todos e que podemos chamar de Depressão Típica, com ansiedade, crises de choro imotivadas, angústia, tristeza e desânimo geral ou, de outra forma, de maneira mascarada, a qual, didaticamente podemos chamar de Depressão Atípica. Nesse caso a tristeza pode ser bem menor ou mesmo nem aparecer e o estado de ânimo pode estar até normal.
Existem, como veremos, formas de Depressão com muitos sintomas físicos misteriosos e dificilmente esclarecidos por exames médicos. Comecemos com os sintomas vagos e atípicos que devem sugerir início de Depressão conseqüente ao Esgotamento: Lista 1 Dores sem causa física: cabeça, abdominais, pernas, costas, peito e outras Alterações do sono: insônia ou sonolência excessiva Perda de energia: desânimo, desinteresse, apatia, fadiga fácil Irritabilidade: perda de paciência, explosividade, inquietação Ansiedade: apreensão contínua, inquietação, às vezes medo inespecífico Baixo desemprenho: alterações sexuais, memó ria, concentração, decisões Queixas vagas: tonturas, zumbidos, palpitações, falta de ar, bolo na garganta Evidentemente não há necessidade da pessoa apresentar todos os sintomas listados acima para suspeitarse de Esgotamento com Depressão. Este mesmo quadro numa determinada pessoa pode não ser igual à outra, baseado naquilo que cada um sente ou mesmo, baseado nos traços de personalidade de cada um. Os sintomas acima refletem uma espécie de esgotamento da capacidade de adaptação às circunstâncias de vida, Esgotamento este, como dissemos, ocasionado ou por excesso de fatores estressantes do dia-a-dia, ou por tendências depressivas e ansiosas da própria pessoa. Por outro lado, o quadro depressivo que acompanha o Esgotamento pode se manifestar de forma típica. Vejamos, então, a lista dos 9 sintomas clássicos e sugestivos de um quadro de franca Depressão Típica: Lista 2 Humor deprimido quase diariamente: tristeza, angústia, pessimismo Redução importante do interesse: perda do prazer com as coisas, desinteresse para mais ou para menos Alterações do sono: insônia ou dormir demais (hipersonia) Alterações psicomotoras: agitação, inquietação ou lentificação Redução da energia: apatia, preguiça, fadiga, perda de força, cansaço Redução da performance psíquica: raciocínio, concentração diminuídos Idéias sobre a morte: pensar sobre, desejar ou não se importar em morrer Alterações da auto-estima: auto-desvalorização, sentimentos de culpa
Alterações do peso:
Na realidade, os pacientes com quadro de esgotamento e franca Depressão conseqüente, poderão sentir alguns (ou todos) dos sintomas da primeira lista (Lista 1) mais alguns (ou todos) sintomas dessa segunda lista (Lista 2). Estresse Algumas Causas Inicialmente devemos ter solidamente em mente, que o estresse não é uma doença por si só. Ele proporciona o desenvolvimento de outros males. O estresse pode ser entendido como um estado de desequilíbrio da pessoa (veja que não uso o termo mental nem físico) que se instala quando esta é submetida a uma série de tensões suficientemente fortes ou suficientemente persistentes. Supondo que o ser humano moderno divide sua vida entre sua casa, seu trabalho e sua sociedade cultural, não há como procurar tratar do estresse determinado por causas exteriores, sem comentar sobre os estressores possivelmente oriundos desses 3 ambientes. Entretanto, supondo também que para o desenvolvimento do estresse patológico, é igualmente necessário uma certa disposição pessoal, sem a qual os agentes (estressores) ocasionais não seriam capazes por si só para produzir a reação de estresse, teremos que falar também sobre o que se quer dizer com disposição pessoal. Finalmente, supondo ainda que, além das disposições pessoais e dos agentes ocasionais há que ser considerado também a qualidade psíquica atual da pessoa que se estressa, falaremos também das circunstâncias emocionais atuais. Vamos ver cada uma dessas causas, começando pelos dois tipos de causas internas; as Disposições Pessoais e as Condições Psíquicas Atuais.
CAUSALIDADE DA REAÇÃO DE ESTRESSE CAUSAS EXTERIORES CAUSAS INTERIORES No trabalho
Condições Emocionais Atuais
No lar Disposições Pessoais Na sociedade Disposição Pessoal O termo Disposição Pessoal se refere ao tipo de disposição com que a pessoa irá contactar a realidade. Não é possível falar disso sem comentar alguma coisa sobre a Personalidade, já que essa Disposição Pessoal está intimamente atrelada à características da personalidade. Entre outras definições sobre personalidade, podemos dizer, sinteticamente, que personalidade é a organização dinâmica dos traços no interior do eu, formados a partir dos genes particulares que herdamos, das existências singulares que suportamos e das percepções individuais que temos do mundo, capazes de tornar cada indivíduo único em sua maneira de ser e de desempenhar o seu papel social. De importante aí temos a idéia de Traços, a idéia de que esses traços, tanto podem ser herdados como adquiridos pela experiência, a idéia de que acabamos por nos transformar em indivíduos únicos e exclusivos e, finalmente, que a personalidade caracteriza uma maneira da pessoa ser (não de estar). Há pessoas que reagem aos estímulos (internos e externos) com mais ansiedade que os outros. Podemos observar essa característica até em berçários; entre os recém nascidos há aqueles mais ansiosos, que choram mais diante do estímulo da fome, que reagem mais agitadamente que outros ao frio, aos estranhos, etc. Esse traço que exalta a ansiedade pode ser herdado (vem nos gens) ou pode ser adquiridos com a experiência, como por exemplo, de acordo com o ditado que diz: " cachorro mordido de cobra tem medo de linguíça". E, como sabemos, a ansiedade é a mola mestra para o desencadeamento do estresse. Na vida prática, vemos algumas pessoas naturalmente ansiosas, ou seja, com traço marcante de ansiedade em sua personalidade, agindo mais ansiosamente diante de estímulos que, normalmente, outras pessoas diante dos mesmos estímulos. Essas pessoas reconhecem como estressores alguns estímulos que não são tão extressores para outros. Vejamos por exemplo, a tarefa de ter que falar em público. Há pessoas cujo psiquismo identifica esse compromisso como sendo altamente estressante, enquanto outras não. Essas pessoas ansiosas reagem desse jeito devido alguns estímulos internos para ansiedade, estímulos estes mais importantes que o próprio compromisso de ter que falar em público. Podem estar ansiosas devido à insegurança, o temor, à auto-estima um tanto baixa, falta de auto-confiança, etc.
Condições Emocionais Atuais Outra motivação interna para o estresse são as Condições Emocionais Atuais. Essas, ao contrário dos traços de personalidade, não caracterizam uma maneira da pessoa ser, mas sim, dela estar (agora, ou nessa fase da vida). As Condições Emocionais Atuais refletem a tonalidade afetiva atual do momento (ou desta fase da vida), enquanto as Disposições Pessoais refletem o perfil afetivo da personalidade. É evidente que uma pessoa, ainda que não tenha traços tão marcantes de ansiedade, terá mais facilidade de estressar-se caso esteja passando por uma fase, por exemplo, de doença grave, depois de ter perdido um ente querido, durante uma grande crise conjugal, econômica ou profissional e assim por diante. Pelas mesma razão, nos períodos depressivos de nossa vida a probabilidade do estresse é enormemente maior que em outras épocas e, se pensarmos que a Organização Mundial de Saúde calcula que 4 em cada 10 pessoas podem estar passando por momentos depressivos, imagine a incidência do estresse. Devido às Condições Emocionais Atuais percebemos que alguns estímulos podem ser estressores em algumas ocasiões e não estressores em outras. Essa dinâmica pode servir para muitas situações em psiquiatria e no contacto da pessoa com a realidade.
Como exemplo sugestivo dessa questão, podemos imaginar uma pessoa que tenha uma séria queimadura nas costas, ocultada pela camisa. Ao nos despedirmos damos-lhe uma fraterno tapinha nas costas, causando extrema dor ao nosso amigo machucado. Embora a intensão tenha sido boa, doeu, e doeu porque a pessoa estava em condições atuais de machucado previamente. Isso quer dizer que os estímulos são recebidos de acordo com as condições pessoais atuais de cada um.
Síndrome de Burnout A chamada Síndrome de Burnout é definida por alguns autores como uma das conseqüências mais marcantes do estresse profissional, caracterizando-se por exaustão emocional, avaliação negativa de si mesmo, depressão e insensibilidade com relação a quase tudo e todos. Outros autores, entretanto, julgam a Síndrome de Burnout algo diferente do estresse. Para nós, de modo geral, vamos considerar esse quadro de extrema apatia e desinteresse, não como sinônimo de estresse, mas como uma de suas conseqüências bastante sérias. Definida como uma reação à tensão emocional crônica gerada a partir do contato direto, excessivo e estressante com o trabalho, essa doença faz com que a pessoa perca a maior parte do interesse em sua relação com o trabalho, de forma que as coisas deixam de ter importância e qualquer esforço pessoal passa a parecer inútil. Esta síndrome afeta, principalmente, profissionais da área de serviços que trabalham em contato direto com os usuários. Entre a clientela de risco, estão os trabalhadores em educação, profissionais em saúde, policiais, agentes penitenciários, os bancários, profissionais liberais, departamentos de vendas e de compras, enfim, funções que obrigam um contacto intenso com o outro. Entre os fatores aparentemente associados ao desenvolvimento da Síndrome de Burnout está a pouca autonomia no desempenho profissional, problemas de relacionamento com as chefias, problemas de relacionamento com colegas ou clientes, conflito entre trabalho e família, sentimento de desqualificação e falta de cooperação da equipe. Os autores que defendem a Síndrome de Burnout como sendo diferente do estresse, alegam que esta doença envolve atitudes e condutas negativas com relação aos usuários, clientes, organização e trabalho, enquanto o estresse apareceria mais como um esgotamento pessoal com interferência na vida do sujeito e não necessariamente na sua relação com o trabalho. Entretanto, pessoalmente, julgamos que essa Síndrome de Burnout seria a conseqüência mais depressiva do estresse desencadeado pelo trabalho. Os sintomas básicos dessa síndrome seriam, inicialmente, uma exaustão emocional onde a pessoa sente que não pode mais dar nada de si mesma. Em seguida desenvolve sentimentos e atitudes muito negativas, como por exemplo, um certo cinismo na relação com as pessoas do seu trabalho e aparente insensibilidade afetiva. Finalmente o paciente manifesta sentimentos de falta de realização pessoal no trabalho, afetando sobremaneira a eficiência e habilidade para realização de tarefas e de adequar-se à organização. Estresse no Trabalho O desgaste emocional a que pessoas são submetidas nas relações com o trabalho é fator muito significativos na determinação de transtornos relacionados ao estresse, como é o caso das depressões, ansiedade patológica, pânico, fobias, doenças psicossomáticas, etc. Em nosso ambiente de trabalho os estímulos estressores são muitos. Podemos experimentar ansiedade significativa (reação de alarme) diante de desentendimentos com colegas, diante da sobrecarga e da corrida contra o tempo, diante da insatisfação salarial e, dependendo da pessoa, até com o tocar do telefone. Fatores intrapsíquicos (interiores) relacionados ao serviço também contribuem para a pessoa manter-se estressada, como é o caso da sensação de insegurança no emprego, sensação de insuficiência profissional, pressão para comprovação de eficiência ou, até mesmo, a impressão continuada de estar cometendo erros profissionais. Isso tudo sem contar os fatores internos que a pessoa traz consigo para o emprego, tais como, seus conflitos, suas frustrações, suas desavenças conjugais, etc. Apesar de não ser possível estabelecer uma fórmula mágica ou regra para análise do estresse no trabalho devido a grande diversidade entre as empresas, vejamos agora algumas situações mais comumente relacionadas ao estresse no trabalho, de um modo geral:
Sobrecarga A sobrecarga de agentes estressores também pode ser considerada um fator importante para eclosão do estresse patológico no trabalho. A sobrecarga de estímulos estressores é um estado no qual as exigências do ambiente excedem nossa capacidade de adaptação. Os quatro fatores principais que contribuem para a demanda excessiva de agentes estressores no trabalho são: 1. urgência de tempo; 2. responsabilidade excessiva; 3. falta de apoio; 4. expectativas excessivas de nós mesmos e daqueles que nos cercam. Falta de Estímulos A falta de estímulos também pode resultar em estresse patológico e doença. O risco de ataques cardíacos, por exemplo, são significativamente maiores nos dois primeiros anos após a aposentadoria. Nesses casos a condição associada ao estresse costuma ser o tédio, a sensação de nulidade e/ou a solidão, portanto, a falta ou escassez de solicitações também proporciona situações estressoras. Às vezes, no final do dia, sentimos nosso corpo exausto mas, apesar disso, experimentamos uma agradável sensação de bem estar. Em geral uma atividade pode se tornar muito gratificante quando possui um significado especial ou quando desperta grande interesse em nós. No trabalho, as atividades medíocres, destituídas de significação ou aquelas onde não temos noção do porquê estamos fazendo isso ou aquilo, podem ser extremamente estressantes. As tarefas altamente repetitivas ou desinteressantes também podem produzir estresse. Essas situações de carência de solicitações ou a sensação de falta de significado para as coisas que fazemos costumam também causar estresse em crianças e idosos. Ruído O ruído excessivo pode causar estresse pela estimulação do Sistema Nervoso Simpático, provocando irritabilidade e diminuindo o poder de concentração. Dessa forma, o ruído pode ter um efeito físico e/ou psicológico, ambos capazes de desencadear a reação de estresse. Este fator estressante pode produzir alterações em funções fisiológicas essenciais, como é o caso do sistema cardiovascular. O ruído também pode influenciar outros hormônios, como a testosterona, por exemplo, e dessa forma, pode ter efeitos prolongados sobre o organismo, considerando que as alterações hormonais são sempre de efeito mais longo. Experiências com pilotos de aeronaves na Argentina demonstraram que, ao ficarem expostos aos ruídos de alta intensidade das turbinas aéreas, sua produção de testosterona reduziu-se pela metade. Além disso, foi relatada uma forte correlação entre a perda de audição devida a ruídos e a concentração plasmática de magnésio. Alterações do Sono O contínuo atraso do sono pelos horários de trabalho, viagens e variações do rítmo das atividades sociais, facilitadas pelo uso da luz elétrica e atrações noturnas, pode levar à insônia e, conseqüentemente ao estresse. Na síndrome de fusos horários das viagens internacionais, recomenda-se não tomar decisão importante ou não competir antes da readaptação fisiológica. Os operários que fazem turnos ou têm trabalho noturno, geralmente possuem um sono de má qualidade no período diurno. Isso se dá em decorrência dos conflitos sociais (coisas que fazemos de dia e coisas que fazemos de noite) e do excesso de ruído diurno. Essa má qualidade do sono acabará provocando aumento da sonolência no período de trabalho (seja noturno ou diurno), muitas vêzes responsável por acidentes, desinteresse, ansiedade, irritabilidade, perda da eficiência e estresse. Falta de Perspectivas A esperança, perspectiva ou expectativa otimista é uma das motivações que mais aliviam as tensões do cotidiano. Saber (ou achar) que amanhã será melhor que hoje, ou o mês que vem melhor que este, ou ano que vem será bem melhor, etc, são sentimentos que aliviam e minimizam a ansiedade e a frustração do cotidiano. Está claro que na falta das boas perspectivas ou, o que é pior, na presença de perspectivas pessimistas a pessoa ficará totalmente à mercê dos efeitos ansiosos do cotidiano, sem esperanças de recompensas
agradáveis. Há ambientes de trabalho onde o futuro se mostra continuamente sombrio. É completamente falso acreditar que funcionários temerosos produzem mais. O medo motiva para a ação durante um breve período de tempo (veja a fisiologia do estresse), mas logo sobrevêm o estado de esgotamento com efeitos imprevisíveis. Mudanças Constantes Esse assunto merece considerações mais amplas. As necessidades de mudanças podem ser comparadas a um ciclo vicioso; o momento presente está quase sempre exigindo mudanças, essas mudanças acabam trazendo novos problemas. Esses problemas despertam novas soluções, as quais passam a exigir novas mudanças e assim por diante.
Mudanças determinadas pela empresa Esse tipo de mudanças pode ser determinada por uma nova chefia ou devido à nova orientação geral da empresa, seja por causa de alguma fusão ou aquisição da empresa. Normalmente esse tipo de mudança pode gerar muita insegurança, inicialmente. Até agora associamos sempre o estresse à adaptação e, diante das mudanças, o que mais se solicita das pessoas é a adaptação, portanto, é o momento onde o estresse está acontecendo. Evidentemente as pessoas naturalmente possuidoras de dificuldades adaptativas sofrerão mais. Abrir mão de métodos usuais para aprender ou aceitar novos métodos sempre exige uma participação emocional importante. A pessoa que passa por momentos de ansiedade e estresse por causa de mudanças deve ter em mente que, mesmo que o departamento esteja sendo "desmontado" ou algum colega estimado esteja perdendo sua posição, ela continuará sendo o mesmo profissional que é, seus conhecimentos continuarão intactos e a empresa poderá utilizá-los até de forma melhor na nova situação. Nessa situação o mais importante é não deixar que considerações emocionais (mágoa, orgulho, inveja, rancor, etc) dominem o lado racional. Mudanças devidas à novas tecnologias A tecnologia normalmente está em contínua substituição por sistemas mais modernos. Nessa situação também as pessoas são emocionalmente solicitadas à se adaptar ao novo. Nesse caso o estresse será variável, de acordo com as Disposições Pessoais e de acordo com o tipo dessa nova tecnologia a ser implantada. Pela Disposição Pessoal sofrerão mais as pessoas com instabilidade afetiva, com traços marcantes de ansiedade ou já previamente estressadas. Em relação às próprias mudanças, sofrerão mais as pessoas confrontadas com novas tecnologias ideologicamente diferentes das anteriores. Na Inglaterra, há anos, foi feita uma pesquisa entre trabalhadores de uma refinaria de petróleo e de uma central telefônica, ambas submetidas à mudanças tecnológicas radicais. Na refinaria, apesar das mudanças para automação terem sido profundas, como o sistema de craqueamento do petróleo é sempre o mesmo, a incidência de estresse foi mínima entre os funcionários, inclusive entre os mais antigos. Entretanto, na telefônica a situação foi muito diferente. O novo sistema não tinha nenhuma analogia com o anterior e os funcionários mais antigos tiveram que ser transferidos ou demitidos. Isso mostra que as exigências para adaptação ao novo exercem profundo impacto sobre a ansiedade (e estresse, conseqüentemente) das pessoas. Mudanças devidas ao mercado As constantes exigências do mercado sempre são levadas a sério pelas empresas e, freqüentemente, determinam mudanças de procedimentos no trabalho. Os ansiosos tende mais para o estresse devido, principalmente, à ansiedade antecipatória, ou seja, a ansiedade que aparece muito antes de quaisquer resultados das mudanças. Embora o bom senso recomende que as pessoas devam estar continuamente atentas aos resultados dessas mudanças, sofrer antecipadamente não resolve problemas, não facilita a adaptação e podem determinar atitudes precipitadas danosas.
Mudanças auto-impostas São as exigências que fazemos de nós mesmos. Em psiquiatria, o mais sadio é que estejamos sempre inconformados e sempre adaptados. Isso significa que, através do inconformismo estamos sempre buscando fazer com que o amanhã seja melhor que o hoje. Entretanto, é indispensável que a pessoa se mantenha adaptada às circunstâncias atuais, mesmo que sejam circunstâncias adversas. Sadio seria reclamar do trânsito, quando este está ruim, para podermos buscar opções que melhorem nossa vida em relação à esse trânsito (mudar itinerários, horários, etc), outra coisa é estarmos padecendo de hipertensão, úlcera, ansiedade ou enxaqueca por causa desse trânsito ruim. Essa é a diferença. O próprio inconformismo humano exige uma reciclagem constante, ou seja, exige mudanças continuadas e necessidades de adaptação à essas mudanças. Encarar a mudança sob uma perspectiva de crescimento e adequação pode ajudar nossa adaptação, considerá-la uma tarefa tediosa, inútil e humilhante "para quem já sabe tanto", favorece o descontentamento, a ansiedade e, conseqüentemente, o estresse. Ergonomia O conforto humano em seu trabalho deve ser sempre considerado, em se tratando de estresse. Como enfatizamos sempre, não devemos privilegiar apenas as razões emocionais em relação ao estresse, por ser este uma alteração global do organismo (não apenas emocional). Aqui deve ser considerado o conforto térmico, acústico, as horas trabalhadas ininterruptamente, a exigência física, postural ou senso-perceptiva e outros elementos associados ao desempenho profissional. Ambientes hostis, em termos de temperatura, unidade do ar e contacto com agentes agressivos à saúde fazem parte da exigência física a que alguns trabalhadores estão submetidos. Daí a enorme importância do acessoramento técnico da Medicina do Trabalho para prevenir estados de esgotamento. Atividades que exigem posições anti-fisiológicas, repetitividade de exercícios danosos, e permanência exagerada em atitudes cansativas fazem parte das exigências posturais a que são submetidas as pessoas durante o trabalho
Conseqüências Conseqüência aos demais As conseqüências do estresse, porém, não se limitam ao próprio indivíduo estressado. Numa comunidade relativamente fechada, como é o trabalho ou o lar, pode ocorrer o fenômeno da "contaminação" emocional. Isso acontece com um pouco de maior freqüência no lar que no trabalho. Através da contaminação emocional os circundantes passam a sentir-se ansiosos devido a ansiedade do paciente. Isso acontece também em relação à irritabilidade, depressão e mau humor. O estressado muitas vezes se comporta como o ditado, segundo o qual, "o condenado se consola na dor do semelhante". Isso significa que muitas vezes ele quer cúmplices para seu mau estar. Assim sendo ele passa a ser mais exigente com as pessoas mais próximas. O excesso de tensão também pode comprometer a comunicação, quando as mensagens não são transmitidas integralmente por falta de paciência ou tolerância. Parece que o estressado cobra ser compreendido por seus próximos além da capacidade deles entendê-lo. Há ainda, e sobretudo, a perda da qualidade no ambiente de trabalho por parte de quem está estressado. O bom senso e a tolerância são profundamente comp rometidos e provocar demissões (seja pedindo ou facilitando para recebê-la) indevidas. A convivência com o estressado fica, assim, seriamente comprometida; tanto no lar quanto no emprego. Essa é a conseqüência de quem esgotou sua capacidade de adaptação e, conseqüentemente sua tolerância, paciência, interesse, bom senso, determinação, persistência e a maioria dos atributos conquistados através de árduo aprendizado. Conseqüência pessoal Em tese, qualquer tipo de doença psicossomática pode se manifestar no paciente ansioso. Além disso, do ponto de vista emocional o estresse está intimamente relacionado à Depressão, à Síndrome do Pânico, aos Transtornos da Ansiedade e às Fobias. Isso tudo sem contar uma vasta lista de sintomas (não doenças) que acompanham o paciente estressado.
Na lista abaixo vemos uma série de sintomas possíveis no paciente estressado, quando este tem tendência a manifestar, como conseqüência do estresse, um transtorno depressivo.
Lista 1 SINTOMAS POSSÍVEIS NA DEPRESSÃO Dores sem causa física: cabeça, abdominais, pernas, costas, peito e outras incaracterísticas Alterações do sono: insônia ou sonolência excessiva Perda de energia: desânimo, desinteresse, apatia, fadiga fácil Irritabilidade: perda de paciência, explosividade, inquietação Ansiedade: apreensão contínua, inquietação, às vezes medo inespecífico Baixo desemprenho: alterações sexuais, memória, concentração, tomada de decisões Queixas vagas: tonturas, zumbidos, palpitações, falta de ar, bolo na garganta Em relação aos sintomas genéricos, agravados ou desencadeados pelo estresse, podem ser acometidos diversos órgãos ou sistemas, conforme se vê na lista abaixo.
Lista 2 SINTOMAS AGRAVADOS OU DETERMINADOS PELAS EMOÇÕES Cardiologia: Palpitações, arritmias, taquicardias, dor no peito Gastroenterologia: Cólicas abdominais, epigastralgia, constipação e diarréia Neurologia: Parestesias, anestesias, formigamentos, cefaléia, alterações sensoriais Otorrino: Vertigens, tonturas, zumbidos Clínica Geral: Falta de ar, bolo na garganta, sensação de desmaio, fraqueza dos membros, falta de apetite ou apetite demais Ginecologia: Cólicas pélvicas, dor na relação, alterações menstruais Ortopedia: Lombalgias, artralgias, cervicalgias, dor na nuca Psiquiatria: Irritabilidade, alterações do sono (demais ou de menos), angústia, tristeza, medo, insegurança, tendência a ficar em casa, pensamentos ruins Há, ainda, a ocorrência das chamadas doenças psicossomáticas. Estas, também desencadeadas ou agravadas pelas emoções, notadamente pelos estados estressantes à longo prazo, podem atingir qualquer órgão ou sistema. Vejamos a lista abaixo.
Lista 3 DOENÇAS PSICOSSOMÁTICAS Cardiologia: Hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, arritmias... Gastroenterologia: Doença de Crown, polipose, diverticulose, insuficiência hepática... Neurologia: Enxaqueca, seqüelas de AVC, hidrocefalias, epilepsia... Otorrino: Labirintopatias, síndromes vertiginosas, zumbidos... Endócrinologia: Diabetes, insuficiência suprarenal, Cushing não iatrogênica, tireóide... Clínica Geral: Reumatismos, Lupus, doença de Reynauld, imunopatias... Ginecologia: Endometriose, esterilidade, insuficiência ovariana... Ortopedia: Lombalgias, ostofitose, osteoartrose...
O Estresse e eu O processo do estresse envolve o organismo todo, o qual assume uma certa postura diante dos estímulos proporcionados pela vida. Esta postura diante dos estímulos (ou diante da vida) dependerá da natureza desses estímulos. Podemos reagir diferentemente diante do fato de recebermos um presente ou uma má notícia mas, é bom saber, todas as vezes em que nos deparamos com algum estímulo será nossa própria pessoa quem julgará a natureza desses estímulos. Como dizia Shakespeare, "as coisas raramente são boas ou más, nosso pensamento é que as faz assim." A ordem para desencadearmos o estresse é sempre determinada por razões subjetivas e pessoais. O estresse começa quando nós percebemos ou entendemos uma situação, pessoa, acontecimento ou objeto como sendo um Fator Estressante, de acordo com nossa interpretação subjetiva. A forma como
percebemos os fatos depende grandemente de nosso psiquismo, de nosso ego, do sistema de valores que cada um tem em si e, até mesmo, da nossa hereditariedade. Acontecimentos felizes, tais como casar, ganhar na loteria ou encontrar um ente querido após uma longa ausência, também produzem estresse, embora, com maior freqüência, este ocorra diante de eventos mais negativos, dolorosos e desagradáveis. Uma mesma situação pode ser percebida de modo totalmente diferente entre dois indivíduos e significar Fator Estressante para um e não para outro. Um deles pode perceber uma determinada situação como um desafio excitante, enquanto o outro pode percebê-la como ameaça à vida. Um farol vermelho pode ser interpretado por uma pessoa como um objeto útil para disciplinar o tráfego, enquanto para outra pessoa pode significar uma fonte de irritação. Além do mais, a mesma pessoa pode perceber e reagir de forma diferente diante das mesmas situações em momentos diferentes, dependendo do estado emo cional geral. Nosso pensamento às vezes caminha de rédeas soltas e, em termos emocionais, nem sempre distinguimos um acontecimento real de outro imaginário. Muitas vezes estamos manifestando emoções desencadeadas por coisas que só existem em nossa imaginação. A maneira como pensamos sobre nosso passado e imaginamos nosso futuro é também uma forma pela qual podemos desencadear a reação de estresse. A formidável força imaginativa da mente controla sempre a resposta do corpo. Reviver lembranças desagradáveis imaginar situações ameaçadoras ou visualizar o presente ou o futuro com apreensão, angústia ou medo, conduz à reação de estresse. Felizmente, o inverso também é verdadeiro, uma vez que temos a possibilidade de fazer um bom uso da nossa imaginação. Enquanto os pensamentos negativos e produtores de ansiedade induzem ao estresse, a imaginação de situações agradáveis e pensamentos positivos têm um efeito benéfico sobre o corpo produzindo uma sensação de bem-estar. Comportamento e Estresse A forma como interagimos com o ambiente pode predispor ao estresse e às doenças à ele relacionadas. Dois cardiologistas americanos, Friedman e Roseman, demonstraram que um determinado tipo de comportamento, denominado de Comportamento Tipo A, induzia ao estresse indevido e excessivo na pessoa e, muitas vezes, nos que estavam próximos a ela. Essas pessoas tinha as seguintes características para serem consideradas portadoras de Comportamento Tipo A: · ·
intensa motivação para atingir objetivos freqüentemente definidos; envolvimento em múltiplas atividades diferentes ao mesmo tempo;
· · · · ·
intensa atitude competitiva; envolvimento constante com o tempo (doença da pressa); alta necessidade de reconhecimento e progresso pessoal; personalidade agressiva que pode se transformar em hostil; personalidade facilmente irritável.
Os indivíduos Tipo A correm risco três vezes maior de desenvolver doença coronária, em comparação com indivíduos que não manifestam esse tipo de comportamento. A hiperatividade do Sistema Nervoso Simpático é o processo patológico principal que induz ao aumento dos riscos cardiovasculares.
Na prática psiquiátrica, entretanto, tudo nos leva a crer que as pessoas previamente ansiosas correm um risco maior de desenvolver estresse e essas pessoas costumam apresentar características comportamentais mais ou menos semelhantes às pessoas consideradas Tipo A. Estresse O Que Fazer Embora tenhamos um grande número de escritos sobre o estresse, como é, como acontece e o que fazer com ele, também arrisco abordar o problema. Em meu entendimento, inicialmente, o mais importante é saber se a pessoa já se encontra num estado de Esgotamento franco por estresse prolongado ou, se faz parte de uma população de risco e quer saber meios de evitar condições onde se desenvolvem o estresse.
Controlando as Emoções Desde os tempos imemoráveis, o autodomínio, o poder de agüentar as tempestades emocionais e procurar ter autonomia psíquica capaz de libertar-nos das amarras da paixão, tem sido procurado avidamente pelas pessoas, como uma espécie de fórmula mágica capaz de nos tornar supre-homens na lida com o cotidiano. Na realidade o objetivo principal e mais sensato a ser conquistado será o equilíbrio psicológico e não a eliminação das emoções pois, os bons sentimentos sempre têm seu valor e seu propósito. Quando as emoções e sentimentos são totalmente abafados e oprimidos os efeitos podem ser piores e mais estressantes ainda. As pessoas não precisam (e nem conseguem) evitar sentimentos desagradáveis, pois eles podem, de alguma forma, contribuir para uma vida criativa e para um crescimento espiritual importante ao desenvolvimento da personalidade. Só não devemos permitir que tais sentimentos carreguem consigo a desadaptação e a doença. Como dissemos anteriormente, é importante manter-nos sempre inconformados, para que nosso amanhã seja melhor que o hoje, porém, sempre adaptados para não adoecermos e, talvez, nem termos um amanhã. Controlar nossas emoções não se aprende com um programa do tipo Dez Lições para Controlar Emoções, ou ainda do tipo, Guia Prático para Perfeito Controle Emocional. Isso tudo costuma ser um punhado de obviedades que gostaríamos de ouvir e, principalmente, que gostaríamos ser possível. Aprender a controlar as emoções é uma lição perene, cujas primeiras aulas começam no nascimento e as últimas nunca chegarão a ser aprendidas. Isso significa, em outras palavras, que ninguém é mestre ou doutor em controle emocional. Estamos todos tentando nosso controle de um jeito ou outro, alguns mais avançados, outros num contínuo ficar de recuperação. Trata-se de uma atividade de tempo integral. Muito do que fazemos é uma tentativa de controlar o estado de espírito. No plano cerebral temos algumas dificuldades no controle sobre quando seremos arrebatados pela emoção e sobre qual tipo de emoção reagiremos. Muitas vezes elas dependem da sucessão de eventos do destino. Emoção e Razão A melhor imagem para analogia sobre atividade racional e emocional que consegui, nesses anos todos de atividade didática, é a do cavalo-cavaleiro. Através dessa analogia espero estar oferecendo meios para podermos lidar melhor com essa questão. Vamos ao exemplo. Imagine você sobre um cavalo (quem está acostumado cavalgar será mais fácil). A partir de uma certa convivência com o cavalo temos a imp ressão de que o conjunto cavalo-cavaleiro forma uma coisa só. A relação entre os dois é tão estreita que até dá a impressão do cavalo obedecer o pensamento do cavaleiro. Essa sensação acontece com freqüência. Pois bem. Agora vamos entender nossa parte racional como se fosse o cavalo e nossa parte emocional como se fosse o cavaleiro. Não, não está errado. De fato o ser humano original faz de sua razão mais uma serva do que senhora da emoção. Há pessoas que se comportam como um cavaleiro afoito e apressado, exigindo o máximo do animal. O sucesso da dupla dependerá das qualidades do cavalo. Se o cavalo for de excepcional qualidade resistirá mais, entretanto, mesmo os puro-sangues poderão entrar em colapso se o cavaleiro não souber dosar sua afoiteza. É o sentimento de ansiedade esgotando a razão, o que mais comumente vemos na clínica. Nesse primeiro exemplo, além da afoiteza do cavaleiro, podemos ter a raiva, a amargura, a mágoa, a depressão, a teimosia, a embriagues, ou qualquer outro estímulo capaz de impor mau uso do cavalo. Muitas vezes é impossível ter capacidade de autocontrole emocional sem a ajuda de remédios. Vamos imaginar agora, um cavalo afoito, xucro, estabanado, mal treinado e indisciplinado. Neste caso o sucesso da dupla dependerá da prudência e do domínio do cavaleiro. Se esse cavalo não se corrigir, com o tempo o cavaleiro acabará esgotado. Vemos isso na prática, quando a parte racional não tem disciplina, conhecimento, treinamento ou habilidade suficiente para atender a emoção. Muitas vezes é impossível ter capacidade de disciplina racional sem a ajuda de terapias. Os extremos são perigosos nas duas partes. Um cavalo muito lento e acomodado fará sofrer o cavaleiro, mesmo que este seja bem intencionado e, vice-versa, um cavaleiro muito apático deixará o cavalo caminhar à esmo, perdendo-se nas dificuldades do caminho.
A pessoa que menospreza a razão em detrimento da sensatez e da consciência, apresenta um defeito grave da forma do pensamento chamado de Pensamento Dereístico. Contrariamente, a pessoa que dispensa totalmente a sensibilidade em favor do uso absoluto da razão também padece de uma grave alteração na forma do pensamento, chamado de Concretismo. A Raiva Existem vários tipos de manifestação da Raiva. Algumas vezes ela surge explosivamente como uma reação rápida e aguda à alguma frustração imediata, outras vezes a Raiva vai nutrindo lenta e surdamente sentimentos de vingança, tal como uma reação crônica à injustiça e indignação experimentados pela pessoa. Trata-se de um dos sentimentos mais aversivos ao organismo humano, um dos sentimentos que mais predispõe ao estresse. Adib Jatene disse certa vez que não é o trabalho que mata, é a Raiva. E provavelmente ele está certo. Outra peculiaridade da Raiva é que ela parece ser, entre todos estados de espírito, aquele que as pessoas têm mais dificuldade para controlar. A Raiva seduz o ser humano porque, ao contrário da tristeza que nos exauri, ela energiza e exalta. Em nosso exemplo do cavalo-cavaleiro, a raiva (cavaleiro) exige do cavalo (razão) todo tipo de insensatez para atender-lhe os anseios. As pessoas elaboram os mais convincentes argumentos racionais para justificar e alimentar à Raiva. O grande desencadeador da Raiva é a sensação de estar ameaçado ou em perigo e, em se tratando de ser humano, nem sempre a ameaça e perigo são situações concretas e contra sua vida. Em grande número de vezes são ameaças emocionais, são ameaças à soberania pessoal, à dignidade, ao orgulho ferido, às pretensões frustradas, aos desejos contrariados, enfim, são ameaças ao bem estar emocional. Na explosão aguda de Raiva, melhor definido como cólera ou ira, há grande liberação de catecolaminas cerebrais, as quais geram um rápido estado de alarme orgânico, um surto de energia física e emocional durante alguns minutos, quando então o organismo todo se prepara para a luta, seja em termos de enfrentamento ou de fuga, dependendo das circunstâncias. Esse primeiro modelo seria quase uma atitude reflexa em reação à ameaça. Num segundo momento, os estímulos aversivos s eriam impulsionados pela amígdala cerebral, percorrem o trajeto hipotálamo -adrenocortical, tal como vimos na fisiologia do estresse, e criaria um estado geral de prontidão para a ação, o qual é mais durável (horas ou mesmo dias) fazendo com que o cérebro fique em estado de alerta para que eventuais reações posteriores sejam rápidas. Nesta fase, quando então o organismo já se encontra em estado de alerta devido a algum estímulo estressor, crises agudas e explosivas de Raiva podem ser mais facilmente disparados. Na teoria da Inteligência Emocional essas crises são chamadas de Seqüestro Emocional, como se nosso organismo fosse gerenciado exclusivamente pelas emoções, subestimando-se quase totalmente a razão. Nessa fase as pessoas agem além do alcance da razão e seus pensamentos giram em torno da ação determinada pela Raiva, indiferente às conseqüências. Até certo nível, a Raiva pode ser controlada ou até ter seu curso interrompido se um outro estímulo conseguir polarizar a atividade mental. Este outro estímulo pode ser sob a forma de algum pensamento mais interessante, pode ser a distração, mudar de ambiente, afastar-se da situação (ou pessoa) que esteja estimulando a Raiva. Mas isso só funciona em níveis controlados de Raiva. Nos casos onde a pessoa é portadora de algum Transtorno no Controle dos Impulsos os medicamentos e a terapia podem ser de extrema ajuda. Os Valores O ideal não é saber colocar a razão à serviço da emoção e nem o contrário. O ideal é saber fazer a emoção e a razão conviverem harmonicamente de forma que uma complete a outra simultaneamente. A primeira lição para lidar com agentes estressores será reaprender a valorizar a realidade, ou revalorizar a realidade. Existem inúmeros escritos sobre como ou o que fazer com o estresse, uma série de livros de auto-ajuda que sugerem fórmulas mágicas e que, normalmente, todos já sabíamos e, infelizmente, entendemos as enormes dificuldades entre a prática e a teoria. Neste tópico sobre valores, entretanto, não descreveremos nenhuma fórmula milagrosa. Pretendemos discorrer sobre um conceito que, se levado à sério e bem refletido, será capaz de produzir importantes mudanças na maneira das pessoas sentirem e reagirem à vida.
As coisas que mobilizam nossos sentimentos são, exatamente, as coisas importantes para nós. Podemos até dizer, sem medo de errar, que nossos sentimentos são mobilizados tanto mais pelas coisas, quanto mais importantes são essas coisas para nós. Vamos agora, juntar à essas afirmações, a idéia de Aristóteles sobre a virtude (já visto anteriormente): "Virtude é a eqüidistância entre dois vícios, um por excesso e outro por falta". Portanto, vamos revalorizar as coisas. Assim sendo, vamos tentar atribuir às coisas valores compatíveis. Depois de alguma discussão com colegas, onde se fez o possível para demonstrar a validade de um ponto de vista, a pessoa pode sentir-se profundamente magoada, ou ofendida e humilhada, ou contrariada, enfim pode experimentar sentimentos desagradáveis tornando a discussão um verdadeiro agente estressor. Racionalmente falando, qual teriam sido os elementos supervalorizados nesse exemplo? 1. 2. 3. 4.
Meu ponto de vista? A opinião contrária do colega? Sentir-me contrariado? Ter que abrir mão de um ponto de vista?
Qualquer um desses casos mereceria uma revalorização, de maneira que não fosse tão valorizado ao ponto de nos causar mal estar, desadaptação ou qualquer outro sentimento produtor de intensa ansiedade, angústia, mágoa, aborrecimento e, por outro lado, nem tão insignificante ao ponto de tornar-nos apáticos, desinteressados e desmotivados. Novamente aqui a questão do bom senso e da sabedoria. O conceito que passamos aqui é o seguinte: No universo psicológico e psiquiátrico só existem duas coisas: o sujeito e o objeto. Sujeitos somos nós, e objeto é tudo que não seja nós mesmos. Englobam os objetos tudo que pertence à realidade; pessoas, objetos materiais, acontecimentos, fatos, eventos, enfim, tudo que está externo à nós. Os objetos, em si, comportam dois tipos de valores: um valor objetivo, material e universal e u m valor abstrato, subjetivo e pessoal. Vejamos, por exemplo, uma barra de 200 gr. de ouro; terá um valor objetivo e material ao qual chamamos cotação (mais ou menos universal) que pode ser expressa em tantos dólares por grama. Ao lado desse valor objetivo, existirá um outro valor subjetivo para cada um de nós que não pode ser expresso em dólares, mas por anseio, necessidade, inclinação, ambição, gosto, enfim, um valor que depende muito da pessoa. Esse valor é tão subjetivo que nem depende da barra de ouro em si, mas da simples idéia da barra de ouro. Algumas pessoas se angustiam por NÃO ter uma barra de ouro, portanto, essa hipotética barra causa sentimentos mesmo sem existir concretamente. Portanto, nossa vida emocional existe de acordo com o valor subjetivo das coisas, ou seja, do valor que as coisas têm para nós. Como sabemos também, é uma função exclusiva do sujeito (de nós) atribuir valores subjetivos às coisas. Portanto, os objetos, coisas, eventos, fatos, acontecimentos e pessoas terão para nós os valores que nós mesmos atribuirmos à eles. A conclusão à qual devemos chegar, será que as coisas poderão influir emocionalmente nas pessoas no tanto e na proporção que essas pessoas "permitirem" que elas valham. As outras pessoas só conseguirão nos ofender, humilhar, magoar ou constranger, na proporção que permitirmos esse valor (e poder) à elas. Valos exemplificar essa questão com duas situações, abordando os lados racional e emocional do problema. Primeiramente, em termos de valores, vamos reconsiderar quais os bens mais valiosos de que dispomos. Quais os nossos bens que não podem ter seus valores expressos por cifras? Evidentemente você escolherá a saúde e a liberdade, dois pré requisitos para todo o resto; para curtir sua família, para trabalhar, passear, viver a vida com satisfação, poder ler isso que está lendo... Liberdade e saúde, apesar de terem valores imensuráveis, nós só nos damos conta disso quando nos privamos delas. Agora vamos aos exemplos. Vamos imaginar que um ladrão nos roube o aparelho de s om do carro. Racionalmente pensando, esse aparelho de som tem um valor objetivo, uma cotação que pode ser expressa por valores numéricos. Entretanto, caso fiquemos extremamente abalados com o roubo ao ponto de termos alguma alteração orgânica de fundo emocional (hipertensão, taquicardia, asma, enxaqueca, etc.) teremos perdido o aparelho de som, propriamente dito, mais nossa saúde, nosso bem estar e nossa felicidade. Isso, materialmente falando, nos custará mais ainda, supondo o tratamento, os medicamentos, médico, dias parados, etc. Trata-se de um prejuízo que pode vir algum tempo depois do estresse, pode ser até que nem consigamos relacionar esse transtorno somatiforme ou psicossomático ao estresse. Mas, se nos
abalarmos emocionalmente, com certeza um dia virá o prejuízo. A opção ainda é do sujeito: permite que lhe roubem só o aparelho de som, ou o aparelho de som mais as despesas com a saúde. Vejamos agora um exemplo eminentemente emocional. Sabendo que nosso maior patrimônio é a saúde e a felicidade, que importância atribuímos à pessoa que permitimos ser capaz de roubar-nos tal patrimônio? Seria inteligente colocar nossa saúde e felicidade nas mãos daquele motorista de ônibus que nem sabemos quem é? Nas mãos daquele imbecil que se diz chefe? Nas mãos daquele colega de trabalho que agora deve estar mais tranqüilo que nós? Nas mãos de quem, exatamente, vamos confiar nosso mais valioso patrimônio? Pensando assim, chegaremos à conclusão de que será sempre um atributo do sujeito (no caso EU) valorizar os objetos, sejam eles pessoas, aparelhos de som, atitudes do cotidiano, perspectivas futuras, etc. Portanto, jamais podemos dizer que Fulano me magoou, que Sicrano me ofendeu, que Beltrano me irritou. Não. Isso jamais acontece sem nossa expressa permissão. Então, só podemos dizer que EU foi quem me magoei com Fulano, EU me ofendi com Sicrano e EU me irritei com Beltrano. Parte integrante de PsiqWeb http://meusite.osit.com.br/ballone/ Por questão ética, ao reproduzir, transcrever ou copiar o trabalho ou parte dele, favor citar a orígem, como está em baixo, p. ex.: BALLONE, G J - Estresse, in. PsqWeb, programa de Psiquiatria Clínica na Internet, http://meusite.osit.com.br/ballone/, Campinas, SP, 1999.